Um Deus entre os mortais (A História de Maradona)

Se você perguntar pra alguns argentinos hoje que viram a Copa de 1986, a final da Copa não foi contra a Alemanha, foi contra a Inglaterra. O estádio estava lotado e com muito policiamento, era um clima de guerra, por causa da Guerra das Malvinas. Naquele dia a seleção foi pra guerra.

Jeferson Wollace
Por Jeferson Wollace 41 Minutos de Leitura

A política do pão e circo era o modo como os líderes da Roma Antiga lidavam com o povo, mantendo a ordem estabelecida e pra conquistar o seu apoio. O futebol tem um pouco disso, somos tão apaixonados por esse esporte que muitas vezes esquecemos as mazelas, os problemas cotidianos da sociedade. Mas existiu um jogador que balançou a política dentro do futebol e trouxe os problemas sociais pra dentro do contexto futebolístico por duas vezes.

O Noite de Copa e o Tyler Martin em clima de Copa América apresentam mais um episódio de C.O.P.A, sobre Diego Armando Maradona, ídolo do Napoli, da seleção argentina e um dos maiores ídolos do futebol pro seu povo. Os anos de glória no Napoli, o período no futebol argentino, no Barcelona e claro, a histórica Copa de 1986.

“Se você perguntar pra alguns argentinos hoje que viram a Copa de 1986, a final da Copa não foi contra a Alemanha, foi contra a Inglaterra. O estádio estava lotado e com muito policiamento, era um clima de guerra, por causa da Guerra das Malvinas. Naquele dia a seleção foi pra guerra.”

C.O.P.A | Cultura. Organização. Política. Arte.
EPISÓDIO | Um Deus entre os mortais (A História de Maradona).

Um Deus entre os mortais (A História de Maradona)

CONTEXTO POLÍTICO: A GUERRA DAS MALVINAS

Em 1833, uma expedição britânica, invadiu as Ilhas do Atlântico Sul. A partir de então, a Argentina reclamou em várias oportunidades a soberania das Ilhas Malvinas – Falklands para os britânicos -, pois os argentinos proclamavam que o território era legitimamente argentino, fato que na época já gerava controversas, pois como afirma o historiador britânico Peter Beck: “os moradores das ilhas queriam continuar sendo britânicos e não queriam ter nenhuma relação com a Argentina”.

No princípio de 1982, o regime militar estava chegando ao seu fim, contestava-se o caráter e a legitimidade do poder dos militares. O regime militar argentino estava nesta época totalmente desgastado politicamente devido às atrocidades contra os direitos humanos bem como pelos erros repetitivos de ordem político e econômico. A essa situação econômica e política, e as pressões por causa das violações dos direitos humanos, levaram a Junta Militar a um beco sem saída.Seu prestigio e sua credibilidade estavam desgastadas no interior do pais e no exterior também, eram reprovados pela opinião pública em geral, a inflação atingia taxas exorbitantes, em fim, sua moral estava muito baixa.

Seguindo a lógica, se pensarmos que somente um apelo comocional muito forte poderia dar esperanças aos militares de continuar se equilibrando no poder, e esta com certeza só poderia ser uma saída digna: o desencadeamento de uma contenda, cuja emotividade patriótica pudesse aglutinar em torno da junta militar e sua representatividade um certo respaldo social, a fim de se manter interinamente no governo e conseguir assim “limpar” a imagem que estava totalmente deteriorada e desfocada em relação ao regime militar e seu governo ditatorial. Ao se planejar uma operação de recuperação do arquipélago a junta militar estava sendo oportunista, pois em caso de uma vitória e a recuperação definitiva das ilhas poderia ser suficiente para a reafirmação de sua posição interna e de suas aspirações futuras no governo.

E foi justamente em 2 de abril de 1982, em uma operação conjunta das forças área, naval e do exercito, que os militares recuperaram as Ilhas Malvinas, (Geórgias e Sandwich do Sul para os Ingleses).

Mais o que cabe aqui ressaltar é a desastrosa ação militar desempenhada pelo alto comando militar argentino, tanto na parte logística de sua ação militar ocasionando muitas e novas mortes e que serviu em contrapartida para acabar de uma vez com todo o prestigio de uma junta militar que já vinha há algum tempo sendo rechaçada internamente pelos seus concidadãos, e internacionalmente frente ao inimigo A derrota das Malvinas, pouco tempo depois, apressaria e determinaria de vez a desintegração do regime militar, pois o fracasso da empreitada de recuperar e manter as ilhas sob o controle Argentino se mostrou um equivoco incontestável por seus resultados nefastos, e o regime militar entrou assim em crise terminal no final deste conflito.

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A OCUPAÇÃO MILITAR DAS MALVINAS

Durante a noite de 1° de abril de 1982 e a madrugada da sexta-feira, dia 2, parte da frota marítima argentina operava junto à costa das Ilhas Malvinas. Entretanto, o número de soldados da marinha britânica no momento da invasão era de cerca de uma centena de homens, sendo assim drástica a superioridade dos argentinos na retomada da ilha. Ainda assim a guarda britânica na capital malvinense (àquela época Puerto Stanley) se armou em atitude defensiva.

Nessa mesma noite se reunia o Conselho de Segurança das Nações Unidas, a pedido do Reino Unido, que denunciou “a iminente ameaça de invasão argentina às ilhas”. A reação argentina foi imediata. O embaixador argentino nas Nações Unidas denunciou no referido Conselho, a situação de grave tensão provocada arbitrariamente por aquele país nas Ilhas Geórgias.

Na manhã da sexta-feira, mediante uma operação combinada das três forças armadas, a Argentina conseguiu desembarcar em Puerto Stanley e ocupar as ilhas, logo após uns poucos combates em diversos lugares das mesmas, que culminaram com a rendição do governador britânico ante o contra-almirante argentino Carlos Busser, a mando das forças nacionais de Infantaria da Marinha, que foram as primeiras a desembarcar. Ao mesmo tempo, o general Osvaldo J. García foi designado comandante das Forças Armadas no desenrolar das operações.

No dia seguinte da ocupação era designado governador das Malvinas o general Mario Benjamín Menéndez, passando a ser o segundo governador argentino da história do Arquipélago.

Aspecto importante a ser destacado e que pode vir a responder o porque do número ínfimo de soldados britânicos a defender a ilha naquele momento tenso, seria o fator ou elemento surpresa da operação militar de retomada das ilhas pela Argentina, pois os britânicos não impuseram o mínimo de reação, visto a rapidez da invasão. A invasão foi feita em certo grau de maneira pacifica, visto é claro a superioridade militar Argentina naquele momento.

Os argentinos logo após a ocupação guarneceram o mar com seus navios, colocaram aviões a pronta disposição e fortificaram a ilha com contingente terrestre.

Em 3 de abril se reuniu, a pedido da Grã-Bretanha, o Conselho de Segurança das Nações Unidas e declarou a Resolução 502 “exigindo a retirada das forças argentinas das Ilhas do Atlântico Sul”. Votaram os 16 membros do Conselho. O único país que votou contra o projeto britânico foi o Panamá. Abstiveram-se China, Espanha, Polônia e a União Soviética.

Em 26 de maio se reuniu novamente o Conselho de Segurança, aprovando a Resolução 505, que reafirma a anterior (502), obrigando as partes no conflito a cooperar plenamente com o Secretário Geral das Nações Unidas, Javier Pérez De Cuellar, em seus esforços para por fim às hostilidades. Entretanto, enquanto se desenvolviam essas gestões de pacificação, o governo britânico alistava grande parte de sua poderosa frota de guerra e a enviava imediatamente, rumo ao teatro de operações. Simultaneamente, tanto o governo inglês como os países da Comunidade Econômica Européia impunham drásticas sanções econômicas e financeiras à Argentina.

Em 28 de maio se reuniram na sede da OEA (Washington) os chanceleres dos 21 países membros do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) e adotaram uma resolução por 17 votos a favor e 4 abstenções (Estados Unidos, Colômbia, Chile e Trinidad-Tobago) “condenando o ataque britânico à Argentina e solicitando aos Estados Unidos que cessasse sua assistência militar ao Reino Unido”. Para completar, autorizou os países latino-americanos a ajudar a Argentina em caráter emergencial; quer dizer, deixando a porta aberta para uma possível ação coletiva contra a Grã-Bretanha. Isso não chegou a se concretizar, ficaram em generalizadas expressões de calorosa solidariedade e apoio diplomático, incluindo, em alguns casos, oferecimentos de eventual ajuda militar. Todas as formas e tentativas de solução pacifica e diplomática foram inúteis.

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A VISITA DO PAPA JOÃO PAULO II

Ante a extrema gravidade da situação, o Sumo Pontífice decidiu viajar de imediato para Argentina. O Papa chegou a Buenos Aires em 1 de junho, permanecendo no país por dois dias, durante os quais desenvolveu uma intensa atividade que compreendeu, fundamentalmente, uma prolongada entrevista com a Junta Militar e com o presidente da Nação, duas missas celebradas pelo mesmo e pelos cardeais, que congregaram centenas de milhares de Fiéis. Uma delas em Palermo e a outra, em Luján. Durante esses atos e outras aparições ante a multidão, o Papa pronunciou comovedores discursos em espanhol, pedindo a toda a nação para orar pela paz.

Antes de voltar para Roma, o Sumo Pontífice manteve uma conversa a sós com o presidente Galtieri, cujos termos nunca foram revelados.

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O FIM DA GUERRA

Após a investida e conseqüente recuperação dos Argentinos das ilhas do Atlântico Sul especialistas e diversos outros teóricos se puseram a especular, pensar e comentar sobre a possibilidade ou não de uma possível investida e recuperação das ilhas por parte dos ingleses.

Diziam ser a logística militar, o fator supremo para uma investida inglesa, visto que o arquipélago situa-se a cerca de 13.000 kilometros de distância da base militar mais próxima dos ingleses e apenas uns poucos 500 kilometros dos portos e aeroportos argentinos.

Sendo assim, era muito mais fácil para os argentinos manterem sua posição, pois para todo tipo de operação sendo de defesa ou ataque estavam estes mais próximos da costa continental de seu país, propiciando a devida segurança e abastecimento regular de seus contingentes. Ao contrário dos ingleses com suas bases situadas do outro lado do mar, em outro extremo.

Outro detalhe também importante era que a cada dia que passava desde a ocupação das ilhas, os argentinos estariam aproveitando para reforçar ao máximo sua posição defensiva. Por outro lado também, na medida em que se avançassem às semanas e os meses, se aproximava o rigoroso inverno austral que assola as ilhas todos os anos e sempre no primeiro semestre. Ao se aproximar deste terrível inverno, a situação adversa deste clima resultaria em uma dificuldade progressiva para qualquer tipo de operação militar, aérea, naval ou mesmo terrestre.

Depois de muito se especular e contradizendo as especulações aos mais diferentes tipos de argumentos levantados, os ingleses estavam preparados para a sua reação, a operação levaria o nome de: Operação “Corporate”.

O governo britânico colocou uma frota cirurgicamente calculada para transportar até as ilhas do Atlântico Sul um certo contingente de forças terrestres, com a missão de recuperar o arquipélago. Compôs também uma força aérea capaz de apoiar as unidades de desembarque, dando segurança a elas para o cumprimento da missão.

O contingente militar britânico seria da ordem de 10.000 homens, sendo que 7.500 estariam disponibilizados para combater na linha de frente, diretamente. Do lado Argentino, especula-se que o comando militar aumentou seus efetivos para 12.500 homens que ficariam em total prontidão. O chefe do exercito do Ar e membro da junta governante, brigadeiro Basílio Lami Dozo dizia que iria dar a ordem aos seus pilotos de atacar em massa a frota britânica assim que estes entrassem em seu raio de ação.

Ao mesmo tempo em que o Papa elevava suas súplicas pela paz, imensas multidões, se recrudesciam nas Malvinas e nas Geórgias na luta depois do desembarque britânico em diversos pontos de seus territórios.

Depois de várias semanas de conflito aéreo e naval – 33 dias – foi na madrugada do dia 21 de Maio de 1982 iniciado a operação chave, e final do conflito no Atlântico Sul; foi neste dia que desembarcou em terra a artilharia e os fuzileiros navais britânicos nas ilhas. A operação terrestre os ingleses dispuseram de cerca de 7.000 homens iniciando uma série de combates que conduziram a rápida ocupação do arquipélago e em sua totalidade.

No dia 14 de junho as forças britânicas pressionaram com uma latente superioridade em armamentos e em efetivos humanos, nas cercanias de Puerto Argentino, capital malvinense.

Ao chegar a tarde desse dia, o Estado Maior Conjunto argentino veio a revelar o comunicado 163, cujo texto dizia: “O Estado Maior Conjunto comunica que o comandante da força de tarefa britânica, general Moore, reuniu-se com o comandante militar das Malvinas, general de brigada Mario Benjamín Menéndez, hoje, 14 de Junho de 1982 às 16 horas. Nesse momento, na zona de Puerto Argentino, há um combate sendo travado, não sendo vencido por nenhuma das duas partes”.

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No mesmo dia 14, por volta da meia-noite, foi firmada a Ata Final de Rendição do comandante das forças argentinas de ar, mar e terra, general Menéndez, ante o general J. J. Moore como representante do governo britânico. O general Menéndez, ao firmar, grifou a palavra “incondicional” que seguia a de “rendição”, e outra que ficou ilegível.

Desde a assinatura da Ata de Rendição em 14 de Junho de 1982, como resultado do conflito armado, a situação político-jurídica com o Reino Unido pela posse do Arquipélago e seus arredores não tem mudado substancialmente. A Argentina continua pleiteando em todos os foros internacionais seus direitos à soberania destes territórios e sua intenção de reiniciar as negociações bilaterais; mas as mesmas se vêem paradas, dado que o governo inglês se mantém inflexível em sua posição de não aceitar proposições partindo do governo argentino quanto à questão da soberania, uma vez que se afirma em sua conhecida tese que o futuro das ilhas deve ser resolvido pelos ilhéus.

A HISTÓRIA DE MARADONA: PRIMEIROS ANOS

Diego Armando Maradona nasceu em 30 de outubro de 1960, no Hospital Policlínico (Policlínico) Evita em Lanús, Província de Buenos Aires, em uma família pobre de origem galega que havia se mudado da Província de Corrientes. Ele foi criado em Villa Fiorito, uma favela na periferia sul de Buenos Aires, Argentina, sendo o primeiro filho depois de quatro filhas. Tinha dois irmãos mais novos, Hugo (el Turco) e Raúl (Lalo), ambos também jogadores profissionais de futebol. Seu pai Diego Maradona “Chitoro” (1927–2015) era descendente de Guaranis, e sua mãe Dalma Salvadora Franco, “Doña Tota” (1930–2011), era de ascendência italiana.

Os pais de Maradona nasceram e foram criados na cidade de Esquina, na província de Corrientes, no nordeste do país, morando a apenas duzentos metros um do outro nas margens do rio Corriente. Em 1950, eles deixaram Esquina e se estabeleceram em Buenos Aires. Maradona recebeu sua primeira bola de futebol como um presente aos três anos de idade e rapidamente se tornou dedicado ao jogo.

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PRIMEIROS CONTATOS COM O FUTEBOL

Aos oito anos, Maradona foi observado por um caçador de talentos enquanto jogava no clube de sua vizinhança, Estrella Roja. Atuou no Los Cebollitas, o time de juniores do Argentinos Juniors de Buenos Aires. Como um goleiro de 12 anos, ele divertia os espectadores mostrando sua magia com a bola durante os intervalos dos jogos da primeira divisão. Ele nomeou o craque brasileiro Rivellino e o ponta-esquerda do Manchester United George Best entre suas inspirações enquanto crescia.

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CARREIRA POR CLUBES

BOCA JUNIORS

E foi em um amistoso contra o Argentinos que Maradona fez sua estreia pelo Boca, marcando de pênalti, atuando pelos dois times. Parte da concordância do Argentinos em emprestá-lo estava em uma cláusula do contrato de venda em que proibia que Diego enfrentasse a antiga equipe em jogos oficiais. Dois dias depois, atraiu 65 mil pessoas à Bombonera para vê-lo marcar duas vezes em vitória por 4–1 na primeira partida oficial, contra o Talleres de Córdoba. Amistosos, todavia, seriam continuamente disputados paralelamente às disputas do metropolitano, servindo para arrecadar finanças ao clube e gerando também uma Diegomania. Em dois deles, enfrentou dois adversários que lhes seriam comuns: o Milan, em San Siro (vitória por 2–1) e Zico, contra o Flamengo, no Maracanã (derrota por 0–2).

Naquele ano de 1981, com o Boca, Maradona fez grande dupla com Miguel Ángel Brindisi, com os dois marcando juntos 33 dos 60 gols que reconduziram o time ao título metropolitano — a primeira conquista do clube auriazul em cinco anos. Maradona também marca em seu primeiro Boca x River, em um 3–0 listado entre as dez inesquecíveis vitórias do Boca em Superclásicos pela enciclopédia do centenário do clube; ele fez o último gol, deslocando o goleiro Ubaldo Fillol e completando para as redes antes que Alberto Tarantini conseguisse bloquear seu ângulo.

Nas quartas-de-final, os boquenses enfrentaram o Vélez Sarsfield. Na Bombonera, em um tumultuado jogo de ida, em que os dois times terminaram a partida com nove jogadores, Maradona acabaria revidando uma das faltas que sofreu e foi suspenso pela comissão disciplinar da AFA. Seria seu último jogo oficial pelo clube do coração: o Boca acabaria eliminado pelo adversário na partida de volta. Maradona ainda participaria de amistosos em excursões do clube pelas Américas e Ásia antes de ser vendido para o Barcelona por uma transferência recorde de mais de 7 milhões de dólares acertada pouco antes da Copa do Mundo FIFA de 1982. Coincidência ou não, sem seu grande astro, o Boca só voltaria a ser campeão argentino onze anos depois.

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FC BARCELONA

Maradona chegou à Catalunha como um messias. O Barça vivia carência de títulos desde o final da década de 1950. Desde 1960, só conseguira vencer o Campeonato Espanhol em 1974. Via o rival Real Madrid se distanciar cada vez mais no ranking de vencedores e ainda sentia o Atlético de Madrid aproximando-se, com um título a menos. O clube fez de tudo para que seu astro se sentisse à vontade, contratando vários argentinos para servirem-lhe de assessores e funcionários. A estratégia não teria bons resultados: o craque acabou por fechar-se naquele círculo de convivências e demoraria a se adaptar no estrangeiro.

Na primeira temporada, ele enfrentou o primeiro problema: em dezembro de 1982, sofreu de hepatite e ficou de fora dos campos por três meses. Os blaugranas terminaram apenas em quarto; o título de 1982–83 ficou com o Athletic Bilbao. Na Copa do Rei, porém, decidiu a final contra o Real Madrid, marcando nos dois jogos da decisão e sendo aplaudido de pé pela torcida do arquirrival após a vitória por 2–1 em pleno Santiago Bernabéu — na partida de ida, no Camp Nou, o Barcelona havia deixado o rival empatar após estar vencendo por 2–0.

Mal iniciou a segunda temporada e, num jogo contra o Athletic, Maradona sofreu uma entrada bastante desleal do adversário Andoni Goikoetxea, fraturando o tornozelo esquerdo. O astro levou 106 dias para retomar o futebol. Quando voltou, conduziu os blaugranas ao caminho do título. No entanto, por um ponto, a taça ficou justamente com o Athletic. Ambos os times decidiram também a Copa do Rei, e um novo dia ruim contra a equipe basca (que vence por 1–0) fez Maradona surtar. Ele protagonizou uma briga generalizada entre os jogadores.

O craque argentino, que já não tinha um relacionamento bom com a diretoria do Barcelona, foi praticamente descartado após receber uma suspensão de três meses em razão da confusão: a cúpula culé aceitou a oferta do pequeno Napoli, da Itália. Desgostoso com o que julgou como falta de esforço do clube em defendê-lo nos tribunais, Maradona acatou a transferência, encerrando um ciclo de dois anos de altos e baixos no Camp Nou.

Declararia em sua autobiografia, Yo Soy Diego, que o presidente Josep Lluís Núñez teria inveja de sua popularidade e era o principal responsável direto por sua saída. No livro, Maradona também apontou a coleção de fatores que o impediram de triunfar no Barcelona: desde a hepatite e lesões até gostar mais de Madrid. Ele também revelou que foi na Catalunha que começou seu relacionamento com as drogas. Aceitou a proposta do Napoli pois também estava arruinado financeiramente; chegou a doar a casa que tinha em Barcelona para pagar suas dívidas.

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NAPOLI

Embora tradicional, a equipe napolitana era minúscula. Seus troféus resumiam-se a títulos nas divisões inferiores e a duas conquistas na Copa da Itália. Maradona foi logo amado e venerado como um rei, chegando de helicóptero a um Estádio San Paolo tomado por torcedores que ainda custavam a acreditar. Ele, curiosamente, poderia ter chegado antes ao time: o clube o havia sondado em 1979, quando ainda estava no Argentinos Juniors, mas ele recusara a proposta na época. “Para mim, Napoli era apenas uma coisa italiana, como pizza”, comentou.

O espanto foi geral: a equipe mais vencedora do país, a Juventus, também estaria interessada, de acordo com a imprensa. Maradona terminou por escolher o clube celeste porque “foi o único a me fazer uma proposta real e porque o Giampiero Boniperti, ex-jogador e presidente da Juventus na época, já havia dito que um jogador com meu porte físico não chegaria a lugar algum”. De acordo com as lendas, o presidente do Napoli, Corrado Ferlaini, teria blefado: depositou na federação italiana um envelope vazio, onde deveria estar o contrato do jogador, a fim de registrá-lo logo. Era o que ele precisava para ganhar tempo, enquanto a manobra era descoberta, para levantar o dinheiro para pagar o Barcelona.

Fiz o que me recomendaram: falei “Buonasera, napoletani. Sono molto felice di essere con voi.” e chutei a bola nas arquibancadas. Eles deliravam e eu não entendia nada.
— Maradona, sobre sua chegada apoteótica ao estádio do Napoli.

Na primeira temporada, o clube ficou apenas em oitavo, mas somente dez pontos atrás do campeão Verona. Na segunda, a de 1985–86, conseguiu um terceiro lugar. Sua terceira temporada começou com ele já consagrado em todo o planeta, com a conquista da Copa do Mundo de 1986. Em setembro, porém, surge a primeira grande polêmica extracampo: sua ex-empregada doméstica, Cristina Sinagra, denuncia que Maradona é o pai do filho que ela teve. A paternidade é confirmada posteriormente na justiça. O filho, Diego Sinagra (também conhecido como Diego Armando Maradona Jr.), jamais seria assumido e os dois só teriam seu primeiro encontro em 2003. Ainda assim, é na temporada 1986–87 que Maradona dá ao Napoli seu primeiro título na Serie A, sobre a poderosa Juventus. A festa termina completa no clube e na vida pessoal: paralelamente, o Napoli é também campeão da Copa da Itália, e nasce sua filha Dalma (batizada com o mesmo nome da mãe de Diego). Na temporada seguinte, Maradona, com quinze gols, alcança a artilharia do campeonato. O vice artilheiro é a sua dupla ofensiva, o brasileiro Careca — que fora para a equipe justamente para poder jogar ao lado de Maradona —, com treze. O bi, porém escapa por três pontos: o título fica com o Milan de Marco van Basten e Ruud Gullit, que consegue a liderança em vitória direta, em plena Nápoles, quando os dois clubes enfrentaram-se na antepenúltima rodada. O clube rossonero tornar-se-ia o maior rival do Napoli pelos títulos italianos: a Juventus decaía com a aposentadoria de Michel Platini em 1987 e a Internazionale vivia certa carência. Na Copa dos Campeões da UEFA, o Napoli cai cedo: é eliminado pelo Real Madrid, primeiro adversário que enfrenta.

Na temporada 1988–89, o campeonato italiano vai surpreendentemente para a Inter de Milão, com a perseguição única do Napoli (único time na reta final com chances de tirar o título da Inter) terminando em vão. O consolo fica por conta da Copa da UEFA: Maradona lidera o Napoli na campanha rumo ao primeiro título continental do clube. Nos mata-matas finais, o clube passa pela rival Juventus e pelo Bayern de Munique até chegar na decisão, contra o Stuttgart. Os alemães são vencidos no embalo da dupla de Maradona com Careca: ambos marcam na vitória de virada no jogo de ida, em Nápoles, e seguram o empate na Alemanha Ocidental. Paralelamente, naquele ano ele casa-se em um estádio fechado com a namorada de infância, Claudia Vilafañe, e nasce Gianinna, sua segunda filha.

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Durante a temporada 1989–90, o argentino novamente destacou-se como o maior jogador do Napoli na conquista do Scudetto, com dois pontos de vantagem sobre o Milan. Maradona vivia o auge da carreira. A veneração em Nápoles em torno dele era tamanha que ele sentiu-se à vontade para convocar a população local para torcer pela Argentina, e não pela Itália, na Copa do Mundo de 1990, a ser realizada em solo italiano em semanas. Gerou enorme polêmica no resto do país, notadamente no norte, região dos times mais tradicionais, ressentidos com o sucesso meteórico do Napoli, que, por sua vez, era um clube de uma região historicamente desfavorecida no país. O presidente da federação italiana chegou a ir a público pedir que os cidadãos napolitanos torcessem pela Azzurra, e pesquisas de opinião foram feitas por jornais e revistas para calcular a que ponto Maradona conseguira influenciar Nápoles.

Durante trezentos e sessenta e quatro dias do ano, vocês são considerados pelo resto do país como estrangeiros e, hoje, têm de fazer o que eles querem, torcendo pela seleção italiana. Eu, por outro lado, sou napolitano durante os trezentos e sessenta e cinco dias do ano.

— Maradona, reiterando os pedidos para que os napolitanos apoiassem a Argentina na Copa de 1990, e não a anfitriã Itália.

Na Copa, Maradona liderou uma Argentina esfrangalhada ao vice-campeonato, mas eliminando a Itália nas semifinais, aumentando o rancor do resto do país. 1990/91 significar-lhe-ia um baque maior que a fratura em 1984 e as constantes pancadas no duro futebol italiano: novamente, o Napoli caiu cedo na Copa dos Campeões, na disputa por pênaltis contra os soviéticos do Spartak Moscou. Nada comparado ao que vem em março de 1991: seu exame antidoping após partida contra o Bari dá positivo para cocaína, escancarando o vício do astro nas drogas.

Ele, ligado por provas robustas com a Camorra, a máfia napolitana, foi suspenso do futebol por quinze meses. Entra em depressão e, no mês seguinte, em abril, é, sob efeito de drogas, preso em Buenos Aires pela polícia no bairro de Caballito.

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O DECLINIO

O Napoli conseguiu se virar na temporada 1991–92 sem seu maior ícone, terminando em quarto. Maradona, decidido a deixar o time, protagonizou uma batalha judicial que durou 86 dias. A liberação foi brecada pelo presidente do clube, que estava brigado com o argentino. Após intervenção da FIFA, Maradona conseguiu se desligar do Napoli e acertou um retorno à Espanha, agora como jogador do Sevilla, na época comandado por Carlos Bilardo, seu ex-técnico na Seleção. Anos mais tarde, Ferlaini, o antigo presidente do Napoli, declararia que Diego fora salvo diversas outras vezes do antidoping, que era burlado com a urina de jogadores “limpos” nas vezes em que o argentino era sorteado.

Sua estadia no clube andaluz não durou mais que a temporada 1992–93, onde fora apenas razoável: Maradona, pesando mais do que deveria, descobriu que os diretores do Sevilla, com suspeitas sobre suas saídas noturnas, contrataram detetives para monitorá-lo. O argentino, que também desentendera-se com Bilardo, abandonou o time imediatamente e acertou outro regresso, desta vez ao país natal, contratado pelo Newell’s Old Boys. Mesmo recuperando a forma, durou menos ainda na equipe de Rosário: uma sucessão de lesões musculares provocou o término de seu contrato, após apenas cinco jogos oficiais e alguns amistosos, um deles, curiosamente, contra o Vasco da Gama.

Deprimido, Maradona afundou cada vez mais nas drogas. Em fevereiro de 1994, irritado com o assédio da mídia, atirou com uma espingarda de ar comprimido em jornalistas que faziam plantão em frente à sua casa. Acima do peso e desmotivado, a impressão geral era a de que ele abandonaria a carreira antes da Copa do Mundo de 1994. Conheceu então um fisiculturista em Buenos Aires que prometeu deixá-lo em forma novamente. A promessa foi cumprida, mas um novo antidoping durante a Copa desmascaria que, por trás do milagre, estava a proibida substância efedrina, uma droga usada para emagrecer. A FIFA terminou por puni-lo com outros quinze meses de banimento.

Sem poder jogar, Maradona teve uma rápida passagem como diretor-técnico do pequeno Textil Mandiyú. Em poucas semanas, porém, abandonou o cargo do time de Corrientes. Assumiu como treinador do Racing, mas em março do ano seguinte desvincula-se dele também; o presidente que o havia contratado havia perdido as eleições. As duas experiências foram curtas e pouco alentadoras: no Mandiyú, foram doze partidas e apenas uma vitória e, no Racing, onze jogos e apenas dois triunfos. Poderia ter tido menos jogos ainda no Racing: após um 0 a 0 no clássico da cidade de Avellaneda, contra o Independiente, em que foi expulso pelo árbitro, ameaçou sair do cargo, mas foi contido pelo presidente.

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Com o fim da punição, voltou ao seu amado Boca Juniors, comprado por dez milhões de dólares pelo Grupo Eurnekian, que em troca teria os direitos televisivos sobre onze partidas. O retorno, iniciado em jogo contra o Colón, foi estampado até em seus cabelos: Maradona descoloriu uma faixa do lado superior direito, simbolizando a faixa dourada do uniforme boquense. O clube acertou também com seu amigo Claudio Caniggia, outro notório usuário de cocaína. Foi no jogo seguinte, o primeiro oficial dele contra o Argentinos Juniors, que ele marcou seu primeiro gol na volta ao Boca.

O Boca não ganhava títulos argentinos havia cinco campeonatos — o último fora o Apertura de 1992. Com Maradona e Caniggia em grande parceria, o clube conseguiu confortável liderança no Apertura 1995. Porém, em partidas sem seu maior astro, os xeneizes perdem pontos preciosos, chegando e levar de 4–6 para o Racing em plena Bombonera — a mesma quantidade de gols que haviam tomado em todo o torneio, até então. O clube deixou o título escapar para o Vélez Sarsfield e terminou apenas em quarto. O mesmo clube ganhou o Clausura 1996, com o Boca, comandado por Carlos Bilardo (cuja contratação ele se opusera; no mesmo ano, brigaria com o presidente boquense, Mauricio Macri), ficando em quinto. A edição do torneio é mais lembrada por uma goleada de 4–1 sobre o River Plate em que a afinada dupla Caniggia e Maradona se beija na boca, em comemoração após o terceiro gol do atacante loiro.

No entanto, foi o rival quem viveu períodos melhores: ganhou o Apertura 1996 (o Boca, sem tantas presenças de Maradona, fica apenas em décimo), a Copa Libertadores da América de 1996, o Clausura 1997 (nono lugar para o Boca, que só vê Maradona jogar uma vez) e o Apertura 1997. Durante este último campeonato, em que, no início, chegou a ser novamente pego no antidoping, Maradona fez sua última partida profissional, justamente em um Superclássico no Monumental de Núñez, em 25 de outubro. Jogou o primeiro tempo da partida e foi substituído pelo jovem Juan Román Riquelme. O Boca venceu por 2–1 e conseguiu a liderança com dois pontos de vantagem sobre o arquirrival, mas Maradona preferiu anunciar sua retirada, após rumores de novo antidoping positivo. O River conseguiria retomar a dianteira e seria campeão com um ponto de vantagem sobre o Boca.

Falando de si na terceira pessoa, Maradona resumiu seu retorno infrutífero em títulos ao Boca: “O Maradona não está feliz porque sabe que o Maradona está abaixo do padrão em que normalmente se coloca”. Ainda assim, houve setores da imprensa que defenderam sua convocação para a Copa do Mundo de 1998, o que o faria ser um dos recordistas em participações no torneio.

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SELEÇÃO NACIONAL

Maradona fez seu primeiro jogo pela Argentina em 1977, num amistoso contra a Hungria. Integrou o grupo dos pré-convocados para a Copa do Mundo de 1978, mas, apesar do clamor popular para vê-lo no torneio, a ser disputado no país, foi deixado de fora pelo técnico César Luis Menotti, em decisão polêmica em favor de Norberto Alonso, também apreciado por público e mídia — no momento da convocação, este era o artilheiro do campeonato com o futuro campeão River Plate e fizera belo gol no último amistoso, contra o Uruguai, tendo entrado durante a partida. O que mais favorecia Beto Alonso, todavia, era o fato de ele ser o preferido dos dirigentes da AFA, o que incluía o general Carlos Alberto Lacoste.

“Ele ainda é um garoto e precisa amadurecer. Mas sem dúvida ele pode mais que os outros e ainda vai brilhar muito no futebol”, explicou Menotti sobre a decisão de cortar Maradona. Maradona ficou arrasado, mas não guardou mágoas de Menotti, considerado por ele o melhor técnico que já teve, superior até a Carlos Bilardo, o comandante em 1986. Pouco após o corte, foi consolado por Omar Sivori, ex-craque de história no River Plate e na Juventus e que defendera tanto a Argentina quanto a Itália: “Me escute, garoto… você tem a verdade do futebol dentro de si e toda uma vida para mostrá-la”. Apesar da decepção, Maradona chegaria a enviar um telegrama desejando sorte aos jogadores, a acompanhar dois jogos da Albiceleste no Monumental de Núñez, contra Itália e na decisão contra os Países Baixos, e a participar dos festejos pós-título pela cidade de Buenos Aires.

Poderia ter jogado no Mundial de 1978. Estava afinado como nunca. Chorei muito, senti como uma injustiça. (…) Quando se deu a notícia [de que seria cortado] vieram alguns a me consolar: Luque, um grande tipo, o Tolo Gallego… e ninguém mais. Nesse momento eram demasiado grandes para gastar uma palavra com um garoto. (…) O pior foi quando voltei a minha casa. Parecia um velório. Chorava minha velha, meu velho, meus irmãos… esse dia, o mais triste da minha carreira, jurei que iria ter revanche. Foi a maior desilusão da minha vida, me marcou para sempre.
— Sobre o corte da Copa de 1978.

No ano seguinte, Maradona liderou a Seleção na conquista do Campeonato Mundial Sub-20 de 1979. Marcou seis vezes e foi eleito o melhor jogador da competição. 1979 foi também o ano em que ele marcou o primeiro gol pela seleção principal, em sua nona partida por ela. Foi em vitória por 3–1 sobre a Escócia, em Glasgow. Ele também marcou o único gol da Argentina na derrota por 1–2 para Seleção do Resto do Mundo, em amistoso que ironicamente celebrava o primeiro aniversário do título argentino na Copa do Mundo de 1978.

Um Deus entre os mortais (A História de Maradona)

A COPA DE 1982

A Argentina, detentora do título, realizou contra a Bélgica o jogo inaugural da Copa do Mundo de 1982. O time, no papel, era ainda melhor do que o de 1978: reunia a campeã espinha-dorsal formada por Ubaldo Fillol, Daniel Passarella, Mario Kempes, Osvaldo Ardiles, Américo Gallego e Daniel Bertoni somada com as estrelas do título de juniores de 1979, Maradona e Ramón Díaz. Dieguito já era conhecido internacionalmente, ainda mais após a venda para o Barcelona, concretizada pouco antes do mundial.

A estreia de Maradona em Copas, porém, seria desagradável. Ele foi repetidamente chutado e derrubado pelos belgas, chegando a receber entradas violentas pelas costas e ser puxado de cima da bola. Porém, o árbitro tchecoslovaco Vojtech Christov não tomou nenhuma medida contra os adversários, que venceram por 1–0. A Argentina recuperou-se e se classificou após vencer Hungria, em que ele marcou seus dois primeiros gols em Copas, em goleada de 4–1, e El Salvador. A segunda fase seria decidida em quatro grupos com três países, com cada grupo conferindo uma vaga nas semifinais. A Argentina enfrentaria Itália e Brasil.

O primeiro jogo foi entre argentinos e italianos e novamente Maradona seria caçado em campo, com uma truculenta marcação individual de Claudio Gentile. Após levar socos, chutes e joelhadas do início ao fim, foi Maradona, e não Gentile, a receber o cartão amarelo do juiz romeno Nicolae Rainea, que entendia que o argentino reclamava energicamente sem cabimento. A Itália venceu por 2–1 e praticamente obrigou a Argentina a vencer os brasileiros para haver chances reais de classificação.

Contra os rivais, Maradona finalmente veria um cartão vermelho em uma falta desleal que lhe envolvia. Porém, o autor da infração era ele, após desferir com a sola do pé um chute, pensando ser em Falcão, nos testículos de Batista. Cinco minutos antes do fim do jogo, perdido por 1–3, Maradona saía de campo e da Copa. Permaneceu na Espanha, para jogar pelo Barcelona. Reconheceu mais tarde que a seleção vivia um ambiente festeiro e excessivamente confiante antes do torneio.

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A COPA DE 1986 E A CONSAGRAÇÃO À NÍVEL MUNDIAL

Maradona foi convocado para o segundo mundial do México com algumas críticas. Alguns setores da mídia questionavam a escolha do técnico Carlos Bilardo em chamá-lo e ainda por dar-lhe a tarja de capitão. Maradona ainda não havia triunfado totalmente no Napoli. Na Itália, ainda era considerado apenas um bom jogador e malabarista. Mesmo assim, o respeito que despertava em Bilardo era tão grande que o treinador não usaria na competição o convocado Daniel Passarella, estrela e capitão do título da 1978, mas desafeto de Dieguito.

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FASE DE GRUPOS

Maradona novamente apanhou na estreia, contra a Coreia do Sul, vencida por 3–1. No jogo seguinte, marcou o gol argentino no empate em 1–1 contra a campeã Itália. A classificação veio após vitória por 2–0 sobre a Bulgária.

OITAVAS DE FINAL: ARGENTINA x URUGUAI

As oitavas-de-final seriam contra os rivais do Uruguai de Enzo Francescoli. Maradona teve um gol anulado e, instigado, realizou a melhor partida de sua vida, de acordo com o próprio, conforme registrado no livro o livro “Mi Mundial, mi verdad”. A Albiceleste eliminou a Celeste por 1–0, em dia em que ele afirma ter realizado bem todas as jogadas. O próximo adversário da Argentina seria a Inglaterra.

QUARTAS DE FINAL: ARGENTINA x INGLATERRA

Era a primeira vez que ambos se enfrentavam após a Guerra das Malvinas e um clima bastante tenso rondava a partida, fazendo com que o próprio exército mexicano patrulhasse as arquibancadas e as redondezas do Estádio Azteca, chegando a haver tanques nas ruas. O primeiro tempo terminou sem gols. No início do segundo, após driblar marcadores, Maradona passou a bola para um companheiro, que a perdeu. Steve Hodge, zagueiro adversário, chutou alto e a bola foi em direção ao goleiro Peter Shilton. Maradona continuou a correr e, com o punho cerrado, jogou a bola por cima de Shilton, vinte centímetros mais alto, fazendo com que a bola entrasse no gol inglês, naquele gol que ficou conhecido como La Mano de Dios. A despeito dos protestos dos britânicos com o árbitro, o tunisiano Ali bin Nasser, o gol foi validado. Curiosamente, não era a primeira vez que ele fazia isso: em jogo do campeonato italiano de 1984–85 contra a Udinese de Zico, marcou dessa forma e ali, também, a trapaça não fora anulada.

Em espaço de alguns minutos, o argentino marcaria outro gol igualmente célebre, e que ficou conhecido como O Gol do Século. A Argentina trocava passes em seu campo de defesa quando Maradona pediu a bola. Estava de costas para o campo de defesa inglês quando recebeu, tendo em volta três adversários: Steve Hodge, Peter Reid e Peter Beardsley. Quando Beardsley aproximou-se para disputar a bola, Maradona girou em sentido contrário, saindo do meio-de-campo e avançando na meta inglesa. Reid o perseguiu sem sucesso e Terry Butcher foi facilmente deixado para trás, assim como Terry Fenwick.

Butcher continuou correndo atrás, tentando ainda um carrinho quando Maradona tocou para as redes no momento em que Shilton tentou bloqueá-lo. A Argentina se fechou, chegando a sofrer gol de Gary Lineker a dez minutos do fim e quase levar empate do mesmo Lineker depois, mas conseguiu manter a vitória e se classificou. Após a partida, Maradona declarou que “se houve mão na bola, foi a mão de Deus”, para o delírio da torcida argentina, sentindo-se vingada. O outro gol, por sua vez, seria o eleito em 2002 o mais bonito da história das Copas. Porém, este não foi o gol que Don Diego considerou o mais bonito de sua carreira, e sim um que ele fez num jogo amistoso realizado em 19 de fevereiro de 1980, na Colômbia, quando o então jovem Maradona defendia o Argentinos Juniors.

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SEMIFINAL: ARGENTINA x BÉLGICA

Se a Guerra das Malvinas motivara os argentinos contra os ingleses, Maradona continuou especialmente motivado nas semifinais. Reencontraria a Bélgica, que tanto lhe chutara em 1982. Para aumentar a animosidade, o goleiro adversário Jean-Marie Pfaff declarou antes da partida que “Maradona não é nada de especial”. Apesar de novas pancadas, El Pibe perseverou e anotaria dois lindos gols no segundo tempo. No primeiro, passou por dois zagueiros e venceu Pfaff com um chute de trivela. Vinte minutos depois, na entrada da área belga, virou para um lado, avançou para o outro, fingiu que passaria a bola, gingou, deixou quatro adversários para trás e bateu novamente Pfaff, anotando aquele que seria eleito o quarto gol mais bonito da história das Copas do Mundo.

E foi assim, com mais uma atuação magistral de Maradona que a Argentina voltava a uma final.

GRANDE FINAL DA COPA DE 1986: ARGENTINA x ALEMANHA

Na final, a Argentina enfrentaria a tradicional Alemanha Ocidental. Maradona, desta vez, não marcou. O técnico alemão, Franz Beckenbauer, ordenara que Lothar Matthäus marcasse de perto o argentino. Ainda assim, o primeiro gol surgiu em razão dele: Matthäus cometeu uma falta em Maradona que Jorge Burruchaga cobraria para José Luis Brown abrir o marcador. Todavia, Maradona continuou dominado por Matthäus até cinco minutos do fim do jogo. Após estarem perdendo por 0–2, os germânicos haviam acabado de empatar heroicamente. Foi quando Maradona recebeu a bola e, entre dois adversários, deu belo passe para Burruchaga fazer 3–2. Ao final, como capitão, ergueu a Copa que, na opinião geral, ganhara praticamente sozinho.

Não me assustei [após os alemães conseguirem o empate em 2–2]. Quando voltamos à metade do campo para reiniciar [a partida], (…) olhei Burru e lhe disse: ‘veja que estão mortos, já não podem correr. Vamos movimentar a bola que os liquidaremos antes do fim [do tempo normal].
— Sobre o final da decisão de 1986.

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MARADONA E OS NÚMEROS EM 1986

O título fá-lo-ia ser coroado o melhor jogador do mundo pela revista Onze d’Or, premiação que receberia novamente no ano seguinte, após o primeiro título italiano com o Napoli. A Bola de Ouro, por sua vez, ainda era restrita a jogadores europeus, o que só terminaria em 1995. O prêmio de Melhor Jogador do mundo pela FIFA só seria criado em 1991. Ao final da competição, dados do portal Opta Sports revelam que Maradona foi o jogador com mais assistências (5), chances criadas (27) e dribles certos (53) em toda competição. Os 53 dribles certos de Maradona em 1986 são o recorde da história das Copas de um jogador no mesmo torneio desde quando os dados da Opta Sports começaram a ser coletados em 1966.

Dieguito teve influência direta em 71% dos 14 gols anotados pela Argentina na campanha do título (ele marcou cinco tentos e deu cinco assistências para gols), sendo, até hoje, a maior porcentagem individual da história das Copas. Curiosamente, no único jogo em que não teve influência direta no placar (contra o Uruguai), Maradona diz ter sido seu melhor jogo da carreira: “Ganhei todos os mano a mano e fiz magia”, relatou em depoimento ao livro “Mi Mundial, mi verdad”.

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A COPA DE 1990

Quando o mundial começou, Maradona, bem diferente dos dois anteriores, era um jogador totalmente consagrado internacionalmente. Além de líder do bicampeonato mundial argentino, havia, finalmente, dado títulos importantes à até então inexpressiva equipe do Napoli. Mesmo na Copa América de 1989, a terceira que disputou e não venceu, encantara: no jogo contra os uruguaios, apenas o travessão o impediu de fazer um gol do meio-de-campo no Maracanã. Declarou antes da Copa do Mundo que teriam de “arrancá-la de suas mãos”. Embora seu relacionamento com o técnico Bilardo já não fosse tão boa, conseguiu impor-lhe novamente sua opinião na escalação: se em 1986 não queria que Passarella jogasse, em 1990 pressionou o treinador para chamar o amigo Claudio Caniggia. Mas a relação com os italianos em geral, principalmente do norte, talvez fosse pior.

Em razão de sua consagração, foi novamente caçado na estreia e a Argentina, surpreendida com o futebol talentoso mas ao mesmo tempo violento de Camarões, que teve dois jogadores expulsos, perdeu por 0–1 para os africanos. Após a partida, na coletiva de imprensa, ironizou que “o único prazer desta noite foi descobrir que graças a mim os italianos de Milão deixaram de ser racistas: hoje, pela primeira vez, apoiaram os africanos”, em alusão à cidade onde realizara-se o jogo, a mesma onde localizava-se o Milan e a Internazionale, os maiores rivais do Napoli na época. No jogo seguinte, os campeões encararam a União Soviética, que se entusiasmou após o goleiro argentino titular, Nery Pumpido, machucar-se sozinho e sair de maca aos dez minutos.

Os soviéticos passaram a pressionar o reserva, Sergio Goycochea, e abririam o placar com uma cabeçada de Oleh Kuznetsov se a mão de Maradona não entrasse em cena novamente. A bola ia entrando nas redes quando ele apareceu e puxou-a aos seus pés com a mão direita, para mandá-la para longe, e a irregularidade novamente não foi punida pelo árbitro, o sueco Erik Fredriksson. Os argentinos venceriam por 2–0 e, após empatar em 1–1 com a Romênia, passaram por pouco à segunda fase apenas como um dos melhores terceiros colocados, sistema que passara a vigorar naquele mundial.

A Argentina enfrentaria nas oitavas-de-final o Brasil, que havia conseguido três vitórias em três jogos. Com tantas pancadas na primeira fase, Maradona entrou em campo com as pernas e coxas cobertas de equimoses e com uma inchação permanente em seu tão chutado tornozelo esquerdo, que mais parecia uma bola. Isso obrigou-lhe a praticamente apenas caminhar em campo na maior parte de partida. Os brasileiros, melhores em campo, chegaram a acertar três vezes as traves de Goycochea quando, a oito minutos do fim, Maradona finalmente acelerou em campo com a bola nos pés. Atraiu a marcação de quatro jogadores, deixando Claudio Caniggia totalmente livre. Maradona entregou a bola a ele, que só teve o trabalho de vencer Taffarel.

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O heroísmo quase deu lugar à vilania contra a Iugoslávia, nas quartas-de-final. A partida terminou em 0–0 no tempo normal e na prorrogação. Nos pênaltis, Maradona cobrou mal e Tomislav Ivković defendeu. Mesmo com Pedro Troglio também desperdiçando sua cobrança, os sul-americanos avançaram após Goycochea defender os chutes de Dragoljub Brnović e Faruk Hadžibegić — Dragan Stojković já havia errado anteriormente a sua, chutando no travessão.

A semifinal prometia nova atmosfera tensa. A Argentina enfrentaria a Itália, que tanto vinha odiando Maradona. Para completar, o jogo seria em Nápoles. Uma bandeira da Argentina chegaria a ser arrancada da concentração da seleção e Maradona pediu intervenção da embaixada. Mais uma vez, ele apelou a seu público napolitano que torcesse pela Argentina. E boa parte de sua audiência contumaz realmente se sentiu incapaz de torcer contra o ídolo. Os anfitriões saíram na frente e sofreram o empate no meio do segundo tempo — era o primeiro gol que a Itália tomava na Copa. Na jogada, Maradona passou a bola para Julio Olarticoechea cruzar para Caniggia desviar com a cabeça das mãos de Walter Zenga, que ainda não havia tomado gols no torneio. Novamente, os argentinos encararam os pênaltis na Copa. Desta vez, Maradona marcou o seu. Goycochea defendeu outra vez duas cobranças, de Roberto Donadoni e Aldo Serena, e a Albiceleste tirou a Azzurra do caminho. Mais do que nunca, os italianos sentiam um verdadeiro ódio contra Maradona, que declarou que eliminar os anfitriões foi o seu maior feito em Copas, “por todos os significados que teve, embora tenha me custado um montão de coisas depois. (…) Você não imagina o prazer”.

Não foi surpresa que ele tenha sido vaiado antes e durante todo o jogo, na final, novamente contra a Alemanha Ocidental, no Estádio Olímpico de Roma. Durante a execução do hino nacional argentino, preferiu, ao invés de cantá-lo, soltar palavrões inaudíveis ao público. Ele, porém, pouco pôde fazer na partida: a Argentina estava mais enfraquecida na Copa do que nunca, desfalcada de quatro titulares, suspensos: Caniggia, Olarticoechea, Ricardo Giusti e Sergio Batista. Pedro Monzón seria ainda expulso no início do segundo tempo. Os alemães conseguiram a revanche, vencendo com um único gol, de pênalti, a cinco minutos do fim. Os argentinos não perdoariam a marcação a penalidade, duvidosa, e o árbitro mexicano Edgardo Codesal. Gustavo Dezotti, posteriormente, também seria expulso e Maradona receberia um cartão amarelo por reclamação. Ao final da partida, o estádio inteiro se alegrou quando o telão transmitiu o rosto em lágrimas do argentino, que se recusou a apertar a mão do presidente da FIFA, João Havelange, ao receber a medalha de prata.

Esquecendo-se que trapaceara em 1986 e no próprio mundial de 1990, Maradona declarou: Isto foi uma trama armada pela FIFA. Fomos punidos por vencer a Itália, que era a equipe que a FIFA queria que ganhasse esta Copa do Mundo. Há uma máfia no mundo do futebol. Aquele pênalti não existiu. Foi dado de graça para que os alemães vencessem. Ele escreveria em sua biografia, anos mais tarde, que um dia antes da decisão, quando os argentinos foram realizar o reconhecimento do gramado, que Julio Grondona — presidente da AFA e um dos vice-presidentes da FIFA — comentara-lhe que estava com um mau pressentimento, de que os argentinos já estariam fora do título.

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A COPA DE 1994

Maradona, após a suspensão de quinze meses dada pela FIFA, ficou três anos sem jogar partidas oficiais pela Argentina. Em fevereiro de 1993, voltou a vestir a camisa alviceleste para um amistoso contra o Brasil comemorativo do centenário da Associação do Futebol Argentino, e contra a Dinamarca pelo Troféu Artemio Franchi, jogo oficial organizado pela CONMEBOL e a UEFA em conjunto, que reunia o campeão sul-americano e o europeu. Nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994, porém, o craque não vinha sendo utilizado, e sem ele o país não vinha se dando bem: na última partida, chegou a ser goleado por 5 a 0 pela Colômbia em Buenos Aires, e só não foi desclassificado porque o Paraguai não saiu de um empate com o Peru em Lima. Um clamor crescia a cada dia pelo retorno do astro, finalmente chamado de volta para os dois jogos da repescagem, contra a Austrália. O primeiro gol após voltar veio em abril de 1994, num amistoso vencido contra o Marrocos.

Após recuperar milagrosamente a velha forma, Maradona começou a Copa do Mundo FIFA de 1994 dando mais um espetáculo. Marcou de fora da área contra a Grécia e, em famosa comemoração, rugiu com os olhos esbugalhados para uma câmera de TV. Contra a Nigéria, demonstrou fôlego incansável e inspirou os argentinos a vencerem de virada. O milagre por trás da perda de treze quilos — de 89 para 76 — em um tempo assustadoramente curto antes do torneio foi revelado em novo antidoping, que detectou efedrina. A droga, além de ser usada para emagrecer, era também um poderoso estimulante. Para a Seleção Argentina não ser desclassificada, Maradona teve de jurar inocência e a Associação do país teve de retirar seu nome do elenco.

Sentia que havia jogado um partidaço, estava feliz. Veio essa enfermeira a buscar-me e não suspeitei de nada. O único que fiz foi olhar à Claudia [esposa], que estava na tribuna, e lhe fiz um gesto como dizendo-lhe: ‘e essa, quem é?’. Estava tranquilo porque havia feito controles [antidoping] antes e durante o mundial e todos davam bem.
— Sobre após a partida contra a Nigéria, sua última em mundiais.

O episódio gerou bastante revolta na Argentina. Para os mais exaltados, Maradona, que recebera a solidariedade do tenor Luciano Pavarotti, declarado usuário de efedrina, estava sendo vítima de uma conspiração da FIFA. De acordo com a teoria de conspiração, a própria entidade, temerosa que a falta de grandes astros fizesse do mundial dos Estados Unidos um fiasco, havia autorizado informalmente que Maradona usasse substâncias ilícitas para voltar à forma e jogar a Copa. No entanto, suas exibições teriam extrapolado o que a FIFA queria dele, ameaçando interesses de outras seleções. Fato é que Maradona, declarando ser este o episódio mais triste de sua carreira, afirmou: “me cortaram as pernas. Era meu último mundial e iríamos ser campeões”. A teoria foi posteriormente apoiada pelo comentarista brasileiro Sílvio Lancellotti, que, em livro seu sobre a história das Copas do Mundo, comentou que “o Maradona não se dopou em 1994. Estava tomando remédio para emagrecer e foi sacaneado pela própria AFA. No livro, conto como a mulher do Julio Grondona odiava o Maradona. Ela falava aos berros: ‘esse índio tem que se…’. Odiava por preconceito racial. Conto em detalhes”.

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A Argentina em 1994, ao contrário das Copas anteriores, onde o talento se limitava a Maradona, reunia jogadores de renome: Claudio Caniggia se consagrara em 1990 e a seleção tinha também Gabriel Batistuta, Fernando Redondo e Ramón Medina Bello em grande forma. Eles, sem a companhia de Maradona, haviam conquistado as Copas América de 1991 e 1993, torneio que Dieguito não conseguira ganhar nas três ocasiões em que participou (1979, 1987 e 1989).

Porém, os companheiros não conseguiram superar o baque com a saída de Maradona. A Argentina perdeu a última partida da primeira fase por 2–0 para a Bulgária e novamente só se classificou como uma das melhores terceiras colocadas, sistema que não seria mais utilizado a partir da Copa seguinte. Nas oitavas-de-final, veio a eliminação perante a Romênia, jogo em que ele chegou a comentar para um canal de televisão. O jogo contra a Nigéria deixou Maradona, em sua quarta Copa — um recorde entre os argentinos — como o jogador que mais partidas disputou no torneio. Poderia ter sido mais — houve certa pressão para que o agora técnico Daniel Passarella o chamasse para a Copa do Mundo de 1998, mesmo com Maradona já aposentado.
Posteriormente, seu recorde seria superado por Lothar Matthäus em 1998 (em sua quinta Copa, o alemão alcançou a 25ª partida) e igualado por Paolo Maldini em 2002 (a quarta e última do italiano).

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O LEGADO

Maradona não jogaria mais pela Argentina até 10 de novembro de 2001, quando foi realizado um amistoso na Bombonera. O jogo festivo foi contra um combinado de estrelas, dentre elas Enzo Francescoli, Éric Cantona, Davor Šuker, Hristo Stoichkov, René Higuita, Nolberto Solano e até o compatriota Juan Román Riquelme, confirmando assim a despedida do jogador.

A Argentina conseguira vencer a Copa do Mundo FIFA de 1978 sem Maradona. Porém, foi com ele no auge da carreira liderando a Seleção que a Albiceleste, já sem Mario Kempes, Osvaldo Ardiles, Ubaldo Fillol e Daniel Passarella, conseguiu com elencos fracos chegar a outras duas finais de Copa do Mundo, e saindo-se vencedora na de 1986. O país continuou a revelar bons talentos, mas nenhum conseguiu preencher com a mesma mística o vazio deixado com a saída um tanto precoce de El Pibe. Talvez por isso, a Seleção chegou a manifestar o desejo de aposentar o número 10 em sua camisa por ocasião da Copa do Mundo de 2002, mas foi impedida pela FIFA. O técnico Dunga elogiou o jogador como tendo uma boa carreira de técnico.

Os melhores resultados em Copas foram três eliminações nas quartas-de-final, em 1998, 2006 e 2010, sendo ele o treinador nesta última. Mais do que isso, todo jogador promissor a surgir no país recebe o fardo de “novo Maradona”: a alcunha já caiu a diversos nomes, como Claudio Borghi, Diego Latorre (ambos despontaram com Dieguito ainda em boa forma; Borghi chegou a integrar o elenco campeão mundial de 1986), Marcelo Delgado, Ariel Ortega, Marcelo Gallardo, Hernán Crespo, Juan Román Riquelme, Leandro Romagnoli, Javier Saviola, Pablo Aimar, Andrés D’Alessandro, Carlos Tévez, Lionel Messi, Sergio Agüero, dentre outros.

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COMO TÉCNICO DA SELEÇÃO ARGENTINA

Maradona assumiu o comando da Seleção Argentina em outubro de 2008, após a saída de Alfio Basile. Julio Grondona, o presidente da Asociación del Fútbol Argentino, já havia lhe prometido verbalmente o cargo após a Copa do Mundo FIFA de 2006, mas na época optara por Basile. Após o técnico sucumbir com os maus resultados e críticas da imprensa, Grondona pensava em efetivar Sergio Batista, técnico da Seleção Argentina olímpica que conseguira a medalha de ouro nos Jogos de 2008.

Porém, nas próprias Olimpíadas de Pequim, Maradona pavimentou seu caminho. Com permissão livre para acompanhar a delegação, Maradona procurou travar relação forte com os jogadores, muitos deles figuras também da seleção principal, como seu genro Sergio Agüero, Fernando Gago e Lionel Messi. Grondona, doze dias após a demissão de Basile, enfim acatou o desejo de Diego, por razões políticas: o homem mais indicado para o cargo, Carlos Bianchi, era um desafeto pessoal do presidente.

O anúncio causou furor. Quinhentos jornalistas se credenciaram para cobrir a sua estreia, contra a Escócia. Maradona chegou a ameaçar demitir-se em menos de duas semanas, pois Grondona não aceitava o ex-jogador Oscar Ruggeri na comissão técnica. Mesmo endeusado, porém, Maradona continuou a colecionar polêmicas, como discussões indiretas com Juan Román Riquelme, que pediu dispensa da Seleção. Riquelme já se sentia deslocado por não receber a mesma atenção que Maradona dedicava os jogadores “europeus”. O novo técnico ainda tirou-lhe a faixa de capitão, entregue a Javier Mascherano. A gota d’água para Riquelme foi ter sido criticado por Maradona na televisão.

Em 2009, sofreu bastantes críticas. A Argentina obteve resultados vergonhosos, incluindo uma goleada de 1–6 frente à Bolívia em La Paz, o pior resultado da história da seleção — sendo que, ironicamente, Maradona manifestara-se a favor do direito boliviano de usar a cidade, em alta altitude —, e uma derrota de 1–3 para o Brasil em plena Rosário. Os argentinos ficaram ameaçados de não se classificarem, conseguindo no sufoco a última vaga direta no confronto direto contra o Uruguai, em Montevidéu.

Após o árbitro apitar o fim da partida dramática contra o Uruguai, Maradona não se esqueceu das pesadas críticas que sofreu da imprensa, expressando todo o seu ressentimento em desabafos obscenos, gritando em referência aos suas genitais “que la chupen, que la chupen y que la sigan mamando”. A grosseria lhe renderia uma suspensão da FIFA por dois meses, além de uma multa. Posteriormente, pediu publicamente desculpas, mas apenas às mulheres e crianças. A fúria contra a própria imprensa argentina era anterior até mesmo ao caso em que atirara para espantar jornalistas em 1994: em 1991, após ser preso sob efeito de drogas em Caballito, Maradona não perdoou jornalistas que insinuaram a respeito de aventuras homossexuais do jogador, apanhado na companhia de vários homens que os jornalistas apontaram como “suspeitos”.

Na convocação para a Copa, chamou apenas dois de quatro experientes argentinos que haviam contribuído decisivamente para a brilhante temporada 2009–10 da Internazionale triplamente campeã (campeonato italiano, Copa da Itália e Liga dos Campeões da UEFA, feito inédito na Itália): Walter Samuel e Diego Milito, deixando de fora Javier Zanetti e Esteban Cambiasso até da lista dos 30 pré-convocados, bem como o irmão de Diego, Gabriel Milito (do Barcelona) e Fernando Gago (do Real Madrid). Zanetti teria ficado com imagem negativa perante ao treinador após as derrotas para Brasil e Paraguai, nas eliminatórias, e o estilo de jogo de Cambiasso não agradaria Maradona. Gago e Gabriel Milito, por sua vez, pouco haviam jogado na temporada europeia (o madridista, pela reserva e Gabi, por lesões), e o técnico já havia antecipado que iria priorizar quem vinha mantido ritmo de jogo.

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Também para a pré-lista não chamou outros mais famosos, por não viverem boa fase ou não se encaixarem no seu jogo: Pablo Aimar, Javier Saviola, Lucho González, Éver Banega, Pablo Zabaleta e Lisandro López já eram dados como fora do mundial antes mesmo da divulgação da lista preliminar. Maradona não esqueceu, todavia, dos surpreendentes heróis da classificação argentina. Ele havia pré-convocado sete atacantes, deixando de fora da lista final o jovem Ezequiel Lavezzi, destaque do Napoli, favorecendo o veterano Martín Palermo, autor do gol da vitória nos acréscimos sobre o Peru, na penúltima partida, minutos após o gol de empate peruano em pleno Monumental de Núñez. Já uma vaga de volante que poderia ter sido de Gago ficou com Mario Bolatti, autor do único gol da última partida, contra o Uruguai.

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Na disputa da Copa do Mundo FIFA de 2010, os argentinos tiveram um bom começo, obtendo na fase de grupos três convincentes vitórias em três jogos, contra Nigéria, Coreia do Sul e Grécia — curiosamente, Maradona havia enfrentado os três países em primeira fase de Copas também como jogador; o técnico sul-coreano, Huh Jung-moo, havia inclusive jogado contra ele na de 1986. As fases finais também remetiam ao passado, mas mais recente para os argentinos, onde enfrentaram os mesmos adversários da Copa do Mundo de 2006: nas oitavas-de-final, a Argentina obteve grande vitória sobre o México, ganhando a oportunidade da revanche contra a Alemanha, novamente nas quartas. Porém, a competição voltou a se encerrar para os argentinos nesta fase, em derrota pelo inesperado placar de 4–0.

No dia 28 de julho, Maradona foi confirmado que não mais continuaria no comando da equipe. Pouco após a saída, já se lançava um livro sobre o trabalho de Maradona como técnico da seleção. O autor, um dos jornalistas insultados por ele, desfere várias críticas — desde a realização de treinamentos apenas vespertinos por causa da dificuldade de Maradona em acordar cedo, o que fazia os atletas se entediarem pelas manhãs na concentração, até a acusação de que boa parte do alto número de jogadores convocados em um curto período por ele o foram por outros propósitos: seriam empresariados por amigos do técnico, que conseguiam vendê-los para clubes europeus após a convocação.

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Maradona morreu em 25 de Novembro de 2020, uma das coisas que mais chamou a atenção como parte das manifestações do povo argentino foram torcedores do Boca Juniors e River Plate juntos, inimigos mortais dentro de campo, por vezes marcados por clássicos muito hostís e violentos, mas que pelo menos uma vez ficaram unidos, ainda que pela dor da perda.

🎙 “Obrigado Deus, pelo futebol, por Maradona, por estas lágrimas… Por este Argentina 2, Inglaterra 0.”

— Narração argentina original do famoso gol contra a Inglaterra, na Copa de 1986.

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Fontes:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Diego_Maradona
https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerra_das_Malvinas
https://youtube.com/watch?v=_4YbzmgB8wA
https://brasilescola.uol.com.br/guerras/guerra-das-malvinas.htm https://pic.x.com/hzxotsjkvl

Apaixonado por futebol, especialista em futebol alemão e história do futebol. Historiador, acúmulo também conhecimento também na literatura, tendo escrito dois livros.
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