Quando o futebol e política se misturam

Tabaré Vázquez, ex-presidente uruguaio, teve sua paixão pelo futebol ligada ao Club Atlético Progreso, que ele presidiu e levou à elite em meio à ditadura uruguaia.

Davi Saito
Por Davi Saito - PFQL 3 Minutos de Leitura

Muitos afirmam que o futebol e a política não se misturam mas, na prática, não é bem assim. Em um texto passado, a PFQL trouxe a história envolvendo a influência do Boca Juniors para a chegada de Mauricio Macri à presidência da Argentina. Agora, contaremos uma grande história de amor entre um modesto clube uruguaio e o ex-presidente do país, Tabaré Vázquez.

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Em terra de Peñarol e Nacional, dois gigantes da América do Sul, muitos clubes acabam ofuscados. Para Tabaré, porém, nunca foi o caso do Club Atlético Progreso. Nascido em 1940 na capital Montevidéu, o futebol sempre foi uma de suas paixões.

Quando criança, ele assistia aos jogos de seu time passando escondido pela cerca. Essa paixão era de família, pois todos em sua casa eram torcedores do clube e seu avô, José Vázquez, chegou a presidir a equipe.

Quando o futebol e política se misturam

No ramo pessoal, Tabaré começou sua carreira também no esporte, fundando o clube El Arbolito, um time social e esportivo, pelo qual atuou como goleiro reserva. Aos 23 anos, após algum tempo trabalhando para ajudar sua família, ingressou em uma faculdade para fazer medicina, concluindo o curso em 1969.

Entretanto, o que mais importa aconteceu em 1979, quando Tabaré foi eleito presidente do CA Progreso. Logo naquele ano, o clube venceu a segunda divisão uruguaia e conseguiu o acesso à elite. Socialmente, a equipe era muito ativa no comando de Tabaré, principalmente durante o período final da ditadura uruguaia.

Sobre a promoção do Progreso, Tabaré afirmou ter sido o momento mais emocionante vivido com a equipe em uma entrevista: “Aqueles jogos memoráveis ​​contra o Miramar nas manhãs de domingo no Estádio Centenário… Quando o Progreso venceu sua segunda partida e foi promovido, o estádio estava quase lotado com duas instituições menores que atraíam um grande número de pessoas. As caravanas foram proibidas e o clube fez o mesmo. Ele saiu do estádio e fomos em direção à Plaza Independencia. Quando chegamos à Rua Paraguai (que corria no sentido oposto ao de hoje), nos obrigaram a passar pelo Paraguai em direção ao Palácio Legislativo, então pegamos a Avenida Agraçada e depois a Carlos María Ramírez para chegar à sede com uma caravana incrível e ‘um mundo de pessoas’”

Quando o futebol e política se misturam

Durante o começo da década de 80, o nome de Tabaré já era muito vinculado à política e, em 1983, ele se filiou ao Partido Socialista, que era ilegal. Três anos mais tarde, assumiu o Comitê Central do partido. Além disso, em três ocasiões, seu nome foi cogitado para a presidência da Federação Uruguaia. Em uma delas, em 1987, Vázquez chegou a afirmar que seu nome foi barrado pelo então presidente Julio Sanguinetti por sua condição de socialista.

1989 foi um ano histórico para Tabaré, tanto no futebol como na política. No futebol, ainda como presidente do Progreso, viu seu time ter um feito raríssimo no futebol uruguaio: Vencer a primeira divisão. Naquele momento, ele estava em vias de assumir a Prefeitura de Montevidéu, para a qual foi eleito.

Nessa ocasião, ele relatou que “… estava assumindo o cargo de prefeito, estava em uma reunião e fiquei nervoso ouvindo e me contaram como estava o jogo. Assim que me avisaram que estava acabado, saí do encontro para o campo Central e cheguei em plena comemoração daquele dia memorável em que o Progreso se sagrou campeão do A”. Sem dúvidas, um feito histórico.

Quando o futebol e política se misturam

Após assumir o comando de Montevidéu, Tabaré deixou o controle do Progreso, mas nunca abandonou o futebol, e continuou acompanhando seu clube. Com seu carisma e uma gestão bem aprovada, seu nome ganhou projeção nacional e, em 1994, ele foi candidato à presidência, mas foi derrotado. Em 1999, novamente disputou a eleição presidencial e, após vencer o primeiro turno, novamente perdeu, desta vez no segundo turno.

Finalmente, em 2004, Tabaré, pela chamada Frente Ampla, venceu a disputa com maioria absoluta. Com uma plataforma mais centrista em relação ao resto da Frente Ampla (que é de esquerda), fez um governo bastante pragmático e bastante aprovado pela população, com pautas progressistas. Não à toa, fez seu sucessor, José “Pepe” Mujica nas eleições de 2009, e retornou ao poder em 2014 para um segundo mandato. O período, que durou 15 anos ao todo e foi quebrado pela eleição do centro-direitista Lacalle Pou em 2019, foi marcado por pautas progressistas, como a regulamentação do aborto e do consumo da maconha.

Quando o futebol e política se misturam

Ao final de seu mandato, em 2019, Tabaré anunciou ter câncer no pulmão. Bastante debilitado, ele faleceu em dezembro de 2020, aos 80 anos, mas seu legado continuou. A Frente Ampla, seu partido, é considerada favorita para as eleições presidenciais de outubro. Além disso, ainda em vida, o Teatro Progreso foi batizado com seu nome.

Quanto a seu clube, este relembra sua memória constantemente. Um uniforme foi lançado pelo Progreso em homenagem a Tabaré, e ele é vendido em todos os anos. Por fim, o Campeonato Uruguaio de 2021 recebeu o nome de Tabaré Vázquez em sua homenagem.

Quando o futebol e política se misturam

Por Davi Saito PFQL
Um dos criadores da PFQL. São paulino, fissurado em números, política e boas histórias.
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