A História de Mané Garrincha

Se a gente te contasse que o Brasil fez um Pelé e um Maradona e eles jogaram juntos? Inacreditável, eu sei. E além disso, eles dois juntos nunca perderam, parece sonho, mas aconteceu.

Jeferson Wollace
Por Jeferson Wollace 20 Minutos de Leitura
A História de Mané Garrincha

Se a gente te contasse que o Brasil fez um Pelé e um Maradona e eles jogaram juntos? Inacreditável, eu sei. E além disso, eles dois juntos nunca perderam, parece sonho, mas aconteceu. O Pelé, era o próprio Rei em sua plenitude e auge, dispensa apresentações, alguém desde muito cedo ensinado a ser quem ele nasceu pra ser, um membro da realeza. O Maradona era Garrincha, uma figura tão brilhante quanto Edson, mas era controverso, difícil tanto quanto o argentino, um gênio do futebol que não teve a mesma facilidade para driblar o vício que tinha para driblar os marcadores.

O Noite de Copa junto à sua equipe de redatores apresentam mais um episódio de C.O.P.A, sobre Mané Garrincha, ídolo do Botafogo e da Seleção Brasileira. Os primeiros anos de vida, os primeiros anos da carreira, a glória nos tempos de Botafogo e de parceiria com Pelé na Seleção, as polêmicas da vida pessoal e o fim tragédico desse gênio e um dos maiores jogadores da história do futebol.

“Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irônico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios.”

C.O.P.A – Cultura. Organização. Política. Arte.
EPISÓDIO: PRECISO ME ENCONTRAR (A história de Mané Garrincha).

OS PRIMEIROS ANOS DE VIDA E INTRODUÇÃO À GRANDEZA DE MANÉ

Notabilizado pela grande habilidade e por seus dribles desconcertantes, é considerado por muitos como o mais célebre ponta-direita e o melhor driblador da história do futebol. Mundialmente reconhecido como uma figura lendária no esporte, é extremamente popular entre os amantes do futebol no Brasil, onde os fãs mais antigos o consideram melhor até do que Pelé.

Apesar de ter sido acometido por vários defeitos congênitos (ele tinha estrabismo, um desequilíbrio da pelve, seis centímetros de diferença de comprimento entre as pernas; o joelho direito tinha valgismo e o esquerdo varismo), Garrincha, o “Anjo de Pernas Tortas”, foi um dos principais jogadores das conquistas da Copa do Mundo FIFA de 1958 e, principalmente, da Copa do Mundo FIFA de 1962 quando, após a contusão de Pelé, tornou-se o principal jogador do time brasileiro. Dos 14 gols do Brasil na competição, seis (42%) passaram por seus pés (marcou quatro e deu duas assistências para gols). Neste torneio, ele se tornou o primeiro jogador a ganhar a Bola de Ouro (melhor jogador do torneio), a Chuteira de Ouro (artilheiro da competição) e o troféu da Copa do Mundo numa mesma edição. Por conta disso, a Copa do Mundo de 1962 é conhecida no Brasil como “A Copa do Garrincha”.

A História de Mané Garrincha

CARREIRA NO BOTAFOGO

“Estávamos em pânico pensando no que Garrincha poderia fazer. Não existia marcador no mundo capaz de neutralizá-lo.”

Em 1953, aos 19 anos, Garrincha já era titular da ponta-direita da equipe comandada por Gentil Cardoso. O Jornal dos Sports deu as primeiras impressões sobre Garrincha: “As pernas tortas (..) dão-lhe aspecto pitoresco na cancha e fazem com que ele realize um milagre de destreza e agilidades impressionantes. Quando se pensa que já não lhe é possível descobrir ângulo para atirar, passar ou centrar, descobre. E faz tudo, tudo com esmero, uma facilidade assombrosa. De longe, leva a gente a se lembrar de um antigo jogador que tinha o Tupi de Juiz de fora. Chamava-se Fotosfisio.” Ao final da temporada 1953, Geraldo Romualdo Silva elegeu Garrincha “e Paulinho do Madureira” como as revelações do Rio de Janeiro em 1953. Já o jornal A Noite elegeu Garrincha a revelação do futebol em 1953.

Segundo Vargas Neto, que ainda chamava o jogador de Garricha, sem o “n”: “Domingo passado fui ver Garricha jogar. Tem excelentes qualidades, mas ainda precisa aprender um pouco. A primeira coisa que tem que aprender é não ter pressa ao subir… se quiser durar, vá devagar. A ânsia de fazer gols perturba um pouco o craque que começa. Faz três gols num match e depois pensa que sempre precisa fazer.” O comentarista conclui: “Notei que o jovem extrema-direita do Botafogo sabe bater bem na bola. Não é só ter o chute forte que interessa, e ele o tem, mas a certeza de botar a bola onde se quer ou for preciso é de capital importância. E isso Garricha sabe. Por isso mesmo bate os corners (escanteios) dos dois lados e bate bem. Sabe atirar na corrida para o companheiro bem colocado, um passe justo. Isso é consequência de quem sabe bater bem, tem o domínio da esfera. Entretanto, não sabe jogar bem sem a bola nos pés, qualidade que consagrou Sylvio Pirillo. Também ainda não aprendeu a defender a bola com o corpo Era o segredo do Tesourinha e por isso lhe faziam pênaltis quando tentavam interceptá-lo”.

“Um Garrincha transcende todos os padrões de julgamento. Estou certo de que o próprio Juízo Final há de sentir-se incompetente para opinar sobre o nosso Mané.”

Em seu primeiro campeonato, o Carioca de 1953, Garrincha foi o vice-artilheiro com 20 gols, atrás do paraguaio Jorge Benítez do Flamengo, com 22 gols. Por praticamente toda a sua carreira (95% das partidas), Garrincha defendeu o Botafogo (no período de 1953–1965), além da Seleção Brasileira (de 1955–1966). Estreou no clube carioca em 19 de julho de 1953, enfrentando o Bonsucesso, pela segunda rodada do Campeonato Carioca. O Botafogo goleou por 6–3, com três gols de Garrincha, sendo um deles de pênalti.
Ele ajudou o Botafogo a vencer o Campeonato Carioca em 1957, marcando 20 gols em 26 jogos, terminando em segundo lugar nas paradas da liga, e isso convenceu o técnico da Seleção a convocá-lo para a Copa do Mundo FIFA de 1958. “A transformação de Garrincha em mito foi demorada. Nos seus primeiros anos de Botafogo foi criticado por driblar demais. Mas o clássico contra o Fluminense na final de 1957, foi decisivo para sua transformação em ídolo nacional e um dos nomes que não poderiam estar de fora na Copa do Mundo da Suécia.”

A História de Mané Garrincha

A SELEÇÃO NACIONAL

“Não há comparações possíveis. Pelé fazia coisas que um ser humano faz. Garrincha certamente veio de outro planeta… Jamais houve e certamente jamais haverá um outro Garrincha.”

Garrincha jogou 50 partidas oficiais pelo Brasil entre 1955 e 1966, marcando 12 gols, e foi titular da Seleção Brasileira nas Copas do Mundo FIFA de 1958, 1962 e 1966. Ele jogou, ainda, duas partidas na Copa América de 1957 e quatro na edição de 1959, onde o Brasil terminou em segundo em ambas as edições. Sua primeira aparição com a camisa da Seleção foi contra o Chile, no Rio de Janeiro, em 1955. Em todos os seus jogos, participou de apenas uma derrota (de 3–1 para a Hungria na Copa do Mundo de 1966, jogo em que Pelé não jogou). Aquela foi a última vez que Garrincha vestiu a camisa da Seleção em um jogo válido por uma competição oficial. Com Garrincha e Pelé jogando juntos, o Brasil nunca perdeu.

Mesmo na Seleção Brasileira, Garrincha nunca abandonou sua forma irreverente de jogar. Voltava a driblar o jogador oponente, no mesmo lance, ainda que desnecessariamente, só pela brincadeira em si.
Sobre a Copa do Mundo FIFA de 1954, alguns acreditam que Garrincha não foi convocado por ser considerado muito individualista, já que juntamente a comissão técnica da Seleção estava adotando um novo estilo de jogo europeu centrado no trabalho em equipe (o Maracanaço ainda atormentava os dirigentes brasileiros, que acreditavam na necessidade de abordar o futebol de uma maneira mais rigorosa e científica). Além disso, o Brasil tinha outros jogadores talentosos em sua posição, principalmente Julinho Botelho. Garrincha jogou alguns jogos no Campeonato Sul-Americano de 1957, mas foi reserva na Copa Roca do mesmo ano e na Copa Oswaldo Cruz de 1958, quando Joel era o preferido.

A COPA DE 1958

Durante a fase de preparação anterior à Copa do Mundo de 1958, na Suécia, o professor João Carvalhaes, psicólogo da equipe, decidiu submeter os jogadores a testes de aptidão; o método adotado era para que representassem a figura de um homem, e os desenhos mais detalhados revelariam as personalidades mais “sofisticadas”. Garrincha traçou uma figura humana desproporcionalmente grande, alegando que era Quarentinha, seu companheiro de clube. O ponta-direita também se mostrou incapaz de distinguir uma linha horizontal da vertical. Assim, ele obteve uma pontuação menor do que o limiar mínimo estabelecido pela teoria (fez 38 pontos de 123) e o relatório preparado descreveu sua personalidade como infantil. Segundo o psicólogo, convocar Garrincha para a Copa seria um erro, já que ele não tinha condições de enfrentar jogos de muita pressão. O curioso é que Pelé também foi reprovado neste teste, e reza a lenda que Pelé chegou ao Doutor Carvalhaes e afirmou “você pode até estar certo, mas não entende nada de futebol”. Há relatos que dão conta também que antes dos testes serem realizados, o lateral Nílton Santos disse ao psicólogo: “Olha, doutor, vem aí um sujeito de pernas tortas que não vai saber fazer nada disso. Mas tenha paciência com ele, doutor, pois ele joga demais”.

Em 29 de maio, dez dias antes do início da Copa do Mundo, Garrincha marcou um de seus gols mais famosos, contra a Fiorentina, na Itália. Ele driblou quatro defensores e o goleiro, antes de parar na linha de gol. Mesmo com o gol aberto, em vez de chutar a bola para o gol, ele ainda driblou o zagueiro Enzo Robotti antes de marcar o gol. Apesar de seu desempenho impressionante, a comissão técnica da Seleção ficou chateada com o que consideraram uma jogada irresponsável e isso provavelmente levou Garrincha a não ser escolhido nas duas primeiras partidas do Brasil no torneio de 1958. No entanto, precisando do resultado, ele foi escalado para a partida contra a URSS (a última da fase de grupos); essa partida marcou a estreia da dupla “Garrincha e Pelé”. Os soviéticos eram um dos favoritos para o torneio, e para o Brasil, seria o “jogo da vida”.

Para Garrincha, porém, seria apenas um jogo como outro qualquer. Só para se ter uma ideia, antes do jogo, Garrincha foi abordado por com uma pergunta que entrou para a história. Um jornalista, querendo tirar sarro de Mané, o questionou sobre o significado da sigla que ficava na camisa soviética, CCCP – no original: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Sempre ágil, Garrincha disparou: “Cuidado com o criolo Pelé!”.

O técnico brasileiro, Vicente Feola, decidiu atacar diretamente do pontapé inicial. Garrincha recebeu a bola na ala direita, passou por três jogadores adversários e chutou na trave. Com o jogo ainda com menos de um minuto, ele criou uma chance para Pelé, que também chutou na trave. O Brasil, principalmente Garrincha, foi tão impressionante nos momentos de abertura que o início do jogo costuma ser chamado de “os três minutos mais incríveis do futebol de todos os tempos”. Garrincha dava, assim, seu cartão de visitas à Copa do Mundo. O Brasil venceu a partida por 2–0.

No jogo seguinte, realizado no dia 19 de junho de 1958, vitória dos brasileiros nas quartas de final por 1–0 sobre o País de Gales. Após a partida, Mel Hopkins (zagueiro que encarou Garrincha naquele jogo) descreveu o ponta-direita como “um fenômeno capaz de pura magia. Era difícil saber de que maneira ele estava indo por causa de suas pernas e porque estava tão confortável com o pé esquerdo quanto com o direito, para que ele pudesse entrar ou descer pela linha e tinha um chute feroz também”.

Na final contra a Suécia, o Brasil saiu atrás do marcador, mas empatou rapidamente depois que Garrincha superou seu marcador na ala direita e deu um cruzamento para Vavá marcar. Antes do final do primeiro tempo, Garrincha fez uma jogada semelhante, dando nova assistência para Vavá marcar 2–1 para o Brasil. O Brasil terminou de vencer a partida e seu primeiro troféu da Copa do Mundo, com Garrincha sendo um dos melhores jogadores da competição; ele foi eleito para a seleção do torneio.
Enquanto seus companheiros comemoravam a vitória na Copa do Mundo, ele ficou inicialmente confuso, tendo a impressão de que a competição era mais parecida com uma liga e que o Brasil jogaria com todas as outras equipes duas vezes. Tanto que deu uma entrevista dizendo: “Campeonatinho mixuruco, nem tem segundo turno!”.

A História de Mané Garrincha

COPA DE 1962 “A COPA DE GARRINCHA.”

Em 1962, com a contusão de Pelé, descobriu-se um outro Garrincha. De repente parou de brincar, virou sério, compenetrado de que a conquista da Copa dependia dele. Quase sozinho, ganhou a Copa. Fez o que nunca tinha feito. Gols de cabeça, pé esquerdo, folha-seca. E driblou como um endiabrado, endoidando os adversários”.Garrincha foi o jogador mais destacado da Copa do Mundo FIFA de 1962. Quando Pelé se machucou após o segundo jogo e ficou de fora pelo resto do torneio, Garrincha desempenhou um papel de liderança no triunfo do Brasil, destacando-se principalmente contra a Inglaterra e o Chile, marcando quatro gols nesses dois jogos.

Depois de uma vitória e um empate, o Brasil enfrentou a Espanha, sem Pelé. Os sul-americanos estavam perdendo de 1–0 no segundo tempo. Amarildo, substituto de Pelé pelo restante do torneio, marcou o empate. Cinco minutos antes do final, Garrincha pegou a bola no flanco direito, driblou um zagueiro e parou. Nisso, mais um zagueiro chegou para marcá-lo. Ele, então, passou pelos dois zagueiros, e mandou um cruzamento para Amarildo, que marcou o gol da vitória brasileira.

Nas quartas de final contra a Inglaterra, uma história curiosa. Antes do jogo, Nílton Santos disse para Garrincha: “Mané, tem um tal de Fowler no time deles que anda dizendo que você não joga nada e não consegue driblá-lo”. Garrincha perguntou: “Mas quem é esse Fowler?”. Nilton respondeu: “Não sei qual deles é esse cara, acho que você vai ter que driblar alguns deles pra mostrar que você é bom”. Na primeira bola que recebeu, o Garrincha driblou todo mundo que viu pela frente, pelo menos uns seis jogadores. Logo depois, Garrincha abriu o placar de cabeça após um escanteio. A Inglaterra empatou antes do intervalo. No segundo tempo, Vavá marcou o segundo gol do Brasil com um rebote de Garrincha; minutos depois, Garrincha roubou a bola do Didi, fez uma pausa, e, de fora da área, acertou um chute folha-seca no ângulo, marcando o terceiro e derradeiro gol brasileiro. O Brasil venceu por 3–1 e avançou para as semifinais. A imprensa britânica de futebol disse que “Garrincha era Stanley Matthews, Tom Finney e um encantador de serpentes, todos juntos”.

Durante este jogo, um cachorro entrou em campo, paralisando a partida. O cachorro driblava a todos que tentavam pegá-lo, até que o atacante inglês Jimmy Greaves conseguiu segurá-lo. Greaves afirmou que Garrincha achou o incidente tão divertido que levou o cachorro para casa como animal de estimação. O livro de Ruy Castro expande isso, esclarecendo que o cachorro foi capturado por um oficial e sorteado para a equipe brasileira, um sorteio que Garrincha ganhou. O cão recebeu o nome de “Bi” (de “bicampeões” – “bicampeão”).

Sobre sua atuação neste jogo, Celso Unzelte, em sua obra “O Livro de Ouro do Futebol”, tece o seguinte comentário: “Contra a Inglaterra mais uma vez Garrincha fez de tudo, deu seguidos dribles em seu marcador, Alfred Fowler, além de deixar tontos os ingleses Wilson e Bobby Moore. Marcou dois gols e cobrou a falta que permitiu a Vavá fazer o terceiro na vitória 3–1.”

Na semifinal, contra o Chile, Garrincha seria novamente decisivo, marcando dois dos quatro gols da vitória brasileira por 4–2. Seu primeiro gol foi um chutaço de fora da área com o pé esquerdo; o segundo, de cabeça. Uma manchete subsequente no jornal chileno El Mercurio dizia: “De que planeta veio Garrincha?”. Garrincha foi expulso nessa partida após 83 minutos, por retaliar após ser continuamente derrubado. No entanto, ele não foi suspenso para a partida seguinte.

O Brasil enfrentou a Tchecoslováquia na final. Garrincha jogou, mesmo com uma febre de 38 graus, o que não impediu o Brasil de vencer por 3–1 e ele de ser eleito jogador do torneio. Foi a segunda Copa do Mundo consecutiva conquistada por Garrincha e Brasil.

A História de Mané Garrincha


IV – A COPA DE 1966 E O DECLÍNIO APÓS O MUNDIAL

O ponta-direita jogou a Copa do Mundo de 1966 já visivelmente fora de forma. Uma lesão no joelho, que o atormentaria pelo resto de sua carreira, já começava a atrapalhar os seus movimentos. Além disso, foram três jogos extremamente violentos. Os europeus usaram a tática de parar o jogo brasileiro, sempre que possível, na porrada.

“ Vimos Garrincha muito diferente, menos desencantado e mais preocupado, ansioso por demonstrar que ainda era capaz de jogar futebol. ”
— Tostão, em seu livro “Lembranças, Opiniões, Reflexões sobre Futebol”

Mesmo assim, Garrincha jogou a primeira partida do torneio, uma vitória por 2–0 contra a Bulgária, na qual ele marcou um dos gols, com um chute livre executado com a parte externa do pé. O segundo gol deste jogo foi marcado por Pelé, sendo a única vez em que Garrincha e Pelé marcaram gols no mesmo jogo (e também a última vez em que atuaram juntos pelo Brasil). No jogo seguinte, o Brasil perdeu por 3–1 para a Hungria no Goodison Park, na última partida internacional de Garrincha, que foi a única vez que Garrincha perdeu uma partida com a Seleção Brasileira; ele não jogou na última partida da primeira rodada contra Portugal. Com a derrota, o Brasil foi eliminado do Mundial no primeiro turno.

O início do fim da carreira de Garrincha começou já em 1963. À época, a Juventus, a Internazionale e o Milan tentaram em conjunto adquirir o jogador – que, pelo acordo, deveria jogar uma temporada com cada clube – mas não conseguiu um acordo com o Botafogo. O que caracterizou este ano, no entanto, foram os problemas contínuos no joelho, que levaram o médico da Seleção Lídio Toledo a enfatizar novamente a necessidade de uma intervenção e desaconselhar a participação na tradicional turnê de amistosos internacionais que Botafogo costumava organizar. Garrincha se recusou a se submeter a uma operação, apesar da osteoartrite causar inflamação da cartilagem e inchaço do joelho, exigindo um descanso de pelo menos um dia entre os jogos. O Botafogo, no entanto, ordenou que ele participasse dos amistosos, pois sem ele a taxa garantida de participação cairia de doze mil para oito mil dólares. O salário do jogador, o escandaloso relacionamento com Elza Soares e o abuso de álcool se juntaram ao relacionamento com o clube, enquanto a equipe terminou o campeonato na quarta posição, separada por quatro pontos do Flamengo.

Em 29 de setembro de 1964, finalmente ele se submeteu à cirurgia, passando o restante do ano fazendo fisioterapia. Apesar de sua má condição física, precisava de dinheiro para sustentar sua família e seu alcoolismo; assim, Garrincha decidiu continuar jogando no fim de 1965.

O ponta-direita acertou com o Corinthians em março de 1966, onde jogou alguns amistosos antes da Copa do Mundo daquele ano. Ainda atuou em mais alguns jogos pela Taça Brasil. No entanto, com movimentos lentos devido sua cirurgia malsucedida no joelho, não obteve sucesso no Timão e rumou para Portuguesa Santista em 1967. Logo depois passou pelo Fortaleza em 1968, pelo Flamengo em 1969, e pelo Olaria, onde já estava visivelmente longe de seu auge. Integrou o elenco do Vasco em um amistoso contra a Seleção da cidade do Cordeiro, marcando um gol nesta partida. Sua contratação não foi fechada pela equipe cruzmaltina devido a sua má condição física, e com isso o ponta foi devolvido ao Corinthians após o supracitado amistoso. Enquanto esteve no Corinthians, o Jornal da Tarde de 26 de outubro de 1966, assim escreveu sobre Garrincha: “Mané veio para ser a alegria do Corinthians, não foi. É um homem triste que só vê a bola em treino no Parque São Jorge”.

Participou de um amistoso jogando pela equipe gaúcha do Novo Hamburgo, contra o Internacional, numa partida foi realizada no Estádio Beira Rio. Ele vestiu a camisa 7 na noite de 2 de julho de 1969, e o Colorado venceu o Novo Hamburgo por 3–1. Garrincha saiu de campo aos 15 minutos do segundo tempo, sendo muito aplaudido pelos torcedores gaúchos. Antes da partida, Garrincha fez um treino no Estádio Santa Rosa, quando conheceu um pouco do clube e o grupo de jogadores. Ainda no Rio Grande do Sul, no dia 6 de Julho de 1969 foi ao sul do estado jogar outro amistoso, dessa vez pelo Riograndense, o Guri Teimoso, da cidade de Rio Grande. A partida foi contra a equipe do Brasil de Pelotas e acabou num empate de 0–0, com Garrincha tendo atuado somente no primeiro tempo.

O último gol de Garrincha aconteceu no empate do Olaria em 2–2 com o Comercial, no dia 23 de março de 1972, no Estádio Palma Travassos em Ribeirão Preto. Foi, inclusive, o único gol de Mané pelo Olaria. A carreira profissional de Garrincha como jogador de futebol durou até 1972, mas ele jogou partidas de exibição ocasionais até 1982.

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ÚLTIMOS ANOS DE VIDA E MORTE

“Havia jornalistas e, principalmente, intelectuais, que gostavam de dizer que Garrincha era burro. Ora, burro na universidade, todo mundo que não é intelectual, é. Por outro lado, todo intelectual que não é bom de bola, é burro no campo de futebol. O mundo de Garrincha era o campo. Se o mundo fosse um estádio de futebol, Garrincha seria seu rei. Era inteligente para o seu mundo. Ele e Pelé eram os melhores. O que muitas pessoas não entendem é que, aquilo que Garrincha fazia, era inteligente. O que ele fazia fora do campo é que não era inteligente. Ele praticava, fora do campo, a burrice a que essa gente que tomou conta do poder no Brasil desde o século XVI nos condenou. Se somos tão bons de bola também poderíamos ser bons de escola e de outras coisas mais.” — João Batista Freire.

Após uma série de problemas financeiros e conjugais, Garrincha faleceu aos 49 anos em 20 de janeiro de 1983, vítima de cirrose hepática, em coma alcoólico no Rio de Janeiro. Ele havia sido hospitalizado oito vezes no ano anterior e, na época de sua morte, ele estava arruinado, física e mentalmente. Seus últimos anos foram infelizes e obscuros – ele parecia ter se tornado um herói esquecido -, mas sua procissão fúnebre, do Maracanã a Pau Grande, atraiu milhões de fãs, amigos e ex-jogadores para prestar homenagem. Foi velado num caixão sob a bandeira do Botafogo. Em seu epitáfio lê-se “Aqui jaz em paz aquele que foi a Alegria do Povo – Mané Garrincha.” Conviveu com o excesso de ingestão de bebida alcoólica ao longo de sua vida, principalmente cachaça. O fato do seu gosto pela branquinha era tão conhecido que algumas marcas traziam seu nome.

A História de Mané Garrincha

ESTILO DE JOGO E CARACTERÍSTICAS

Garrincha é amplamente conhecido por seu notável controle de bola, imaginação, habilidade de drible e finta, além de sua capacidade de criar chances do nada. Ele também possuía um chute forte com ambos os pés e era um especialista em bolas paradas, conhecido por cobranças de falta e escanteio de trivela (com a parte de fora do pé). No entanto, era por suas habilidades de drible e finta que ele era mais famoso, uma habilidade pela qual ele manteve ao longo de sua carreira. Em relação à capacidade de drible de Garrincha, o escritor de futebol Scott Murray comentou ao escrever para o The Guardian em 2010: “… os resultados são incontestáveis: Garrincha foi o maior driblador de todos os tempos”.
Adorado pelo público brasileiro devido à sua inocência, atitude despreocupada e capacidade de entreter os inclusive os torcedores adversários, Garrincha era conhecido como “Alegria do povo”. Djalma Santos, seu companheiro de equipe no Brasil, afirmou; “Ele tinha um espírito infantil. Garrincha foi a resposta do futebol para Charlie Chaplin”.

Exemplos de sua capacidade de chute são seus gols nas Copas do Mundo contra a Inglaterra, em 1962, e contra a Bulgária em 1966. Ele também era capaz de se virar em torno de si a toda velocidade e explodir em ângulos incomuns, que ele usou com grande efeito. Os inúmeros ataques e oportunidades de gols que ele gerava através de jogadas individuais terminavam frequentemente em um passe exato para um companheiro de equipe em posição de marcar. Isso ocorreu nos dois primeiros gols do Brasil na final da Copa do Mundo de 1958 e no segundo gol contra a Espanha, no torneio de 1962. Ele também era um excelente cabeceador, apesar de sua estatura relativamente baixa. Ele era um dos poucos jogadores que, à época, marcava gols diretamente após cobrança de escanteio, um feito que ele conseguiu fazer quatro vezes em sua carreira.

Considerado um dos maiores jogadores de todos os tempos, ele foi votado na Seleção de Futebol do Século XX por 250 dos escritores e jornalistas de futebol mais respeitados do mundo, ficou em sétimo lugar numa votação entre especialistas da FIFA sobre o melhor jogador do Século XX e foi nomeado na Seleção de Todos os Tempos da Copa do Mundo FIFA.

A História de Mané Garrincha

LEGADO E HOMENAGENS

O Estádio Mané Garrincha, em Brasília, tem esse nome em sua homenagem.

O museu do Estádio do Maracanã chama-se “Museu de Esportes Mané Garrincha” em sua homenagem.
Em 1998, foi escolhido para a seleção de todos os tempos da FIFA, em eleição que contou com votos de jornalistas do mundo inteiro.

Em 2010, torcedores do Botafogo custearam uma estátua de quatro metros e meio e cerca de 300 kg, ao custo de R$ 56 000,00 pagos ao artista plástico Edgar Duvivier (pai de Gregório Duvivier). Essa estátua encontra-se hoje em frente ao Estádio Olímpico Nilton Santos, onde o Botafogo manda seus jogos.
Já em novembro de 2011, durante a convenção mundial de futebol Soccerex, o craque português Eusébio criticou Pelé e declarou abertamente que considerava Garrincha o melhor jogador de todos os tempos.
A força do seu carisma ficou marcada rapidamente nas palavras do poeta de Itabira, Carlos Drummond de Andrade, numa crônica publicada no Jornal do Brasil, no dia 21 de janeiro de 1983, um dia após a morte do genial Garrincha:

ESTÁTISTICAS

BOTAFOGO

Partidas: 614
Gols marcados: 245
Partida de estreia: Botafogo 6–3 Bonsucesso (19 de julho de 1953)
Primeiro gol: na partida Botafogo 6–3 Bonsucesso (19 de julho de 1953)
Última partida: Botafogo 2–1 Portuguesa-RJ (16 de setembro de 1965)
Último gol: Botafogo 1–0 Flamengo (22 de agosto de 1965).

CORINTHIANS

Partidas: 21
Gols marcados: 4
Partida de estreia: Corinthians 0–3 Vasco da Gama (2 de março de 1966)
Primeiro gol: Corinthians 3–2 Cruzeiro (13 de março de 1966)
Última partida: Corinthians 3–2 Santos (9 de outubro de 1966).

ATLÉTICO JUNIOR

Partidas: 1
Gols marcados: 0
Única partida: Junior 2–3 Santa Fé (Barranquilla, 20 de agosto de 1968).
FLAMENGO.
Partidas oficiais: 15
Partidas não-oficiais: 5
Gols marcados: 4
Partida de estreia: Flamengo 0–2 Vasco da Gama (30 de novembro de 1968)
Primeiro gol: Flamengo 2–2 America (19 de janeiro de 1969)
Última partida: Flamengo 1–0 Campo Grande (14 de dezembro de 1969)
Último gol: Flamengo 2–1 ABC (9 de fevereiro de 1969).

NOVO HAMBURGO

Partidas: 1
Gols marcados: 0
Partida de estreia: Internacional 3–1 Novo Hamburgo (2 de julho de 1969)
RIOGRANDENSE.
Partidas: 1
Gols marcados: 0
Partida de estreia: Rio-Grandense 0–0 Brasil de Pelotas (6 de julho de 1969)

OLARIA

Partidas: 10
Gols marcados: 1
Partida de estreia: Olaria 1–1 Flamengo (23 de fevereiro de 1972)
Última partida: Olaria 1–5 Caldense (7 de setembro de 1972)
Único gol: Olaria 2–2 Comercial-SP (23 de março de 1972).

SELEÇÃO BRASILEIRA

Partidas: 60 (52 vitórias, sete empates e uma derrota)
Gols: 17 (12 oficiais)
Partida de estreia: Brasil 1–1 Chile (18 de setembro de 1955)
Primeiro gol: Brasil 5–0 Corinthians (28 de maio de 1958) – Garrincha marcou dois gols na partida
Última partida: Brasil 1–3 Hungria (15 de julho de 1966)
Último gol: Brasil 2–0 Bulgária (12 de julho de 1966, Copa do Mundo FIFA de 1966).

SELEÇÃO CARIOCA

Partidas: 9
Gols: 7
Partida de estreia: Rio de Janeiro 3–2 Pernambuco (9 de março de 1955)
Primeiro gol: Marcado na partida acima
Última partida: Rio de Janeiro 6–4 São Paulo (19 de dezembro de 1962)
Último gol: Marcado no partida acima.
[Obs: Aqui está computada também a partida Combinado Botafogo-Flamengo 6–2 Honved (7 de fevereiro de 1957), no qual Garrincha marcou um gol.]

TOTAL GERAL

Partidas: 688
Gols marcados: 268

TITULOS

BOTAFOGO

Torneio Rio-São Paulo: 1962 e 1964
Taça dos Campeões Estaduais Rio-São Paulo: 1961
Campeonato Carioca: 1957, 1961 e 1962
Torneio Início do Campeonato Carioca: 1961, 1962 e 1963.

CORINTHIANS

Torneio Rio-São Paulo: 1966.

SELEÇÃO BRASILEIRA

Taça Bernardo O’Higgins: 1955, 1959 e 1961
Superclássico das Américas: 1957
Taça Oswaldo Cruz: 1958, 1961 e 1962
Copa do Mundo FIFA: 1958 e 1962

PRÊMIOS INDIVIDUAIS

Melhor jogador do Campeonato Carioca: 1957, 1961 e 1962
Melhor Jogador da Copa do Mundo FIFA: 1962
Seleção da Copa do Mundo da FIFA: 1958 e 1962
Seleção do Ano (World Soccer): 1962
Hall da Fama da FIFA: 1999[68]
Seleção da América do Sul do Século XX (IFFHS): 2000[69]
Hall da Fama do Futebol Mexicano: 2011
Lendas do Futebol (IFFHS): 2016
Bola de Ouro Dream Team (Segunda Equipe): 2020
Maior ídolo da História do Botafogo (O Globo): 2020.

HONRARIAS

Busto de Garrincha na Sede do Botafogo
Busto na Sede do Botafogo Futebol e Regatas
Busto no Estádio Olímpico Nilton Santos
Calçada da Fama do Maracanã
Estátua no Museu do Botafogo
Calçada da Fama da Neo Química Arena.

Mané Garrincha deixou um legado gigantesco para o esporte para além do futebol brasileiro, sua alegria, ginga foi com certeza uma dos maiores motivos que os ingleses, por exemplo, atribuem o “Jogo Bonito” ao Brasil, literalmente “Jogo Bonito” e não Beautiful Game, os ingleses respeitam o futebol brasileiro em nível que eles se referem a beleza do nosso futebol em português. Graças ao Garrincha, Garrincha fez do futebol brasileiro uma marca com padrão de qualidade.

A História de Mané Garrincha

“Se há um Deus que regula o futebol, esse Deus é sobretudo irônico, farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos nos estádios. Mas, como é também um Deus cruel, tirou do estonteante Garrincha a faculdade de perceber sua condição de agente divino. Foi um pobre e pequeno mortal que ajudou um país inteiro a sublimar suas tristezas. O pior é que as tristezas voltam e não há outro Garrincha disponível. Precisa-se de um novo que nos alimente o sonho.”

C.O.P.A | Noite de Copa.

Formado em História pela Faculdade Anhenguera, sou apaixonado por futebol, São Paulino, torcedor do Real Madrid da Espanha e estudioso do futebol alemão, acompanhando a seleção desde 2006. Também me aventuro no mundo da literatura já tendo escrito dois livros, acredito que todos tenham um dom, o meu é escrever e criar histórias.
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