Quando algo ou alguém ultrapassa os limites do tempo e da mística, nós, culturalmente, denominamos como lenda.
Mas existe uma estrutura em Porto Alegre, no bairro da Azenha, de raizes tricolores que provavelmente já ultrapassou o termo.
Nós, do Noite de Copa, vamos contar a maravilhosa história do Estádio Olímpico Monumental: O Estádio das lendas. 🏟🇪🇪
A redação foi escrita por @adornes_be, membro da nossa redação.
Olímpico Monumental
Estádio Olímpico Monumental, que já foi a casa de um dos maiores clubes do país e hoje não reflete em nada as glórias e festas de seu passado tão vitorioso. Como um estádio tão imponente e temido pelos adversários se tornou uma ruína abandonada entregue à mercê do tempo?
Construção
A segunda casa gremista começou a ser idealizada no início da década de 1950. O local que até então recebia os jogos do tricolor era o Estádio da Baixada, porém, com a profissionalização do futebol e o sucesso do clube, a Baixada estava se tornando pequena para comportar os torcedores.
Contudo, ampliações não eram possíveis por conta da falta de espaço físico na Baixada. Era preciso pensar maior, e após as tratativas para um estádio municipal da cidade de Porto Alegre, foi aberto um concurso buscando projetos para o novo estádio gremista.
Foram selecionados os projetos de Armando Ballista, engenheiro, e de Plínio Oliveira Almeida, este arquiteto.
O projeto de Plínio saiu vencedor do concurso e o teve como comandante do projeto até o ano de 1953, quando Armando assumiu o projeto e fez algumas alterações no projeto para torná-lo mais confortável, porém mantendo o projeto arquitetônico.
A construção foi custeada pelo tricolor contando com eventos que contavam com a grande participação dos sócios, à época até sorteios de veículos foram realizados para angariar fundos. Tamanho investimento de tempo e verbas fez com que o time perdesse rendimento esportivamente no período da construção do estádio até a sua inauguração.
Inauguração
No ano de 1954 chegou o momento que tanto a torcida esperava, a inauguração da nova casa do Imortal. Naquele 19 de Setembro, o Grêmio recebeu o Nacional-URU em jogo festivo, mas nem tanto, que marcava a estreia do Estádio Olímpico.
Num jogo sem qualquer cara de amistoso o Grêmio saiu com a vitória, um 2×0 com doblete de Vitor, abrindo caminho para os gloriosos anos que viriam a seguir.
Após o jogo inaugural foi organizado um torneio amistoso que contava com a participação de Grêmio, Liverpool-URU e Internacional. E por um capricho do destino, o primeiro título do Olímpico, mesmo que amistoso, foi conquistado pelo maior rival gremista.
A dupla grenal venceu o Liverpool-URU pelo mesmo placar em seus jogos, um expressivo 4×0, e chegaram para o primeiro clássico do Olímpico em condição de igualdade. Essa que não se refletiu em campo, onde o Inter goleou o time gremista com um acachapante 6×2 que marcou o clássico e o estádio para sempre.
Estrutura e maiores públicos
Localizado no Largo Patrono Kroeff, no bairro da Azenha em Porto Alegre, o Olímpico já teve capacidade de quase 100.000 espectadores e após novas implementações visando a segurança do público, a capacidade total do estádio foi reduzida para 55.000 espectadores.
Contando com mais de 40 camarotes, Tribunas de Honra, 6 vestiários profissionais, Vestiário exclusivo para arbitragem, estacionamento, 2 salas de imprensa, 2 salas para coletivas de imprensa e área destinada a deficientes físicos. Mesmo sendo um projeto antigo, ele era completo em toda a sua estrutura física.
10 Maiores Públicos da História do Olímpico
1️⃣ 98.499 – Grêmio 0x1 Ponte Preta (26/04/1981)
2️⃣ 75.175 – Grêmio 1×0 Vasco (31/03/1982)
3️⃣ 74.238 – Grêmio 0x0 Flamengo (21/04/1982)
4️⃣ 73.093 – Grêmio 2×1 Peñarol-URU (28/07/1983)
5️⃣ 72.893 – Grêmio 1×1 Internacional (29/11/1981)
6️⃣ 72.569 – Grêmio 0x0 Internacional (05/11/1980)
7️⃣ 71.621 – Grêmio 0x0 Internacional (09/02/1989)
8️⃣ 62.807 – Grêmio 2×1 Sport (02/09/1989)
9️⃣ 62.256 – Grêmio 0x1 Flamengo (25/04/1982)
🔟 61.585 – Grêmio 2×1 São Paulo (30/04/1981)
Títulos conquistados pelo Grêmio no Olímpico
Casa do Grêmio de 1954 até o ano de 2012, o Olímpico foi palco de grandes conquistas que marcaram a era mais vitoriosa do Imortal que junto de sua torcida fazia dele um pesadelo para qualquer visitante que entrasse por aqueles portões. Foram ao todo 21 taças erguidas pelo Imortal em seus domínios, são eles:
“ERA OLÍMPICO”
🏆 1x Copa Libertadores
🏆 1x Campeonato Brasileiro Série A
🏆 2x Copa do Brasil
🏆 17x Campeonato Gaúcho
Tais números demonstram um pouco do tamanho da conexão e atmosfera criada ao redor do Monumental que em diversos episódios parecia agir de forma sobrenatural em favor dos gremistas que lotavam as arquibancadas em grandes noites de copa.
Maiores Jogos
São tantos jogos importantes, campanhas inesquecíveis e momentos ímpares vividos no Monumental que fica difícil elencar seus maiores jogos, mas há alguns que se destacam e jamais sairão das memórias de quem os viveu. A seguir separamos alguns destes momentos que marcaram histórias e tornam o Olímpico um colosso distinto em nosso futebol.
Grêmio 5×0 Palmeiras
Jogo de ida das Quartas de final da Libertadores de 1995.
No ano de 1995 o Imortal viria a conquistar sua segunda Libertadores e durante a campanha uma rivalidade aflorou e atingiu seu ápice contra um dos melhores times brasileiros da época, o Palmeiras.
Na fase de grupos já havíamos visto dois confrontos épicos entre as equipes e que criaram uma expectativa ainda maior para aquele embate das quartas. Em um jogo apoteótico, o time de Felipão goleou o Palmeiras com seu time estrelado que contava com Cafu, Rivaldo, Roberto Carlos e cia. A estrela de Jardel foi a que mais brilhou naquela noite, marcando 3 gols e comandando uma noite mágica que jamais sairá da mente de qualquer gremista.
Grêmio 2×0 Portuguesa
Jogo de volta da Final do Brasileiro de 1996.
Naquela tarde de domingo do dia 15 de Dezembro, a torcida lotou o Monumental para apoiar o Tricolor em busca do seu segundo título brasileiro. O adversário era a Lusa que havia vencido o jogo de ida em São Paulo por 2×0 e era liderado em campo pelos jovens Zé Roberto e Rodrigo Fabbri.
Mais de 50 mil torcedores apoiaram o tricolor que no início do jogo abriu o placar com Paulo Nunes, o resultado que estava sendo conquistado não era suficiente, até que aos 39 do segundo tempo, Aílton, que havia saído do banco, marca o gol do título que levou a torcida do imortal à uma festa incontrolável.
Campanha do Grêmio na Libertadores de 2007
Aqui não destaco apenas uma partida, mas sim uma campanha inteira, que por mais que não tenha encerrado em título, é uma demonstração clara da força do tricolor no Velho Casarão.
Após um recente rebaixamento e vendo o rival conquistando suas maiores glórias, o tricolor encarou mais uma Libertadores em sua vasta história com a missão de resgatar a autoestima do clube e do torcedor. Chegando como um azarão na competição, mostrou sua força dentro de casa ao fazer uma campanha quase perfeita dentro de seus domínios com 5 vitórias, 1 empate e 1 derrota como mandante. Eliminando o São Paulo, ao reverter desvantagem em casa, Defensor-URU, tirando uma diferença de 2 gols em casa, Santos, fazendo o resultado em casa e administrando a vantagem na Vila.
O imortal só foi parado dentro de casa ao encontrar um dos grandes times do Boca Juniors, que contava com Riquelme, Palermo e cia.
Grêmio 2×1 Peñarol-URU
Final da Libertadores de 1983.
Aqui temos, provavelmente, o jogo mais emblemático da história do Monumental.
O Grêmio, que vinha de um vice no campeonato brasileiro no ano anterior, chegava em sua primeira final de Libertadores e enfrentava nada mais nada menos que o atual campeão e que se sagrou também campeão mundial no ano anterior. O Peñarol já era tetracampeão da Libertadores e chegava como favorito para a final que seria disputada em dois jogos.
No Centenário, 1×1 e os times vieram para Porto Alegre com tudo em aberto e para alcançar a Glória Eterna, seria necessário que o campeão entregasse até a última gota de suor.
Em um Monumental cheio, o Grêmio conquistou sua primeira Libertadores calando a todos que apontavam o Peñarol-URU como campeão antes da hora. Ali se iniciou a história tão tradicional do clube em Copas Libertadores e vimos os primeiros lances decisivos de Renato Portaluppi, de muitos que viriam após.
O Abandono
Depois de tantas histórias, conquistas, glórias e memórias, o Olímpico deixou de ser a casa do Imortal dando lugar a moderna Arena do Grêmio. Um fim melancólico e que se arrasta até os dias atuais.
No ano de 2006, Eduardo Antonini, então dirigente do Conselho Deliberativo, foi encarregado da missão de elaborar um plano diretor para o Olímpico, que já passava dos 50 anos de existência. Ele então foi à Alemanha para observar os estádios da Copa do Mundo e buscar inspirações do que poderia ser feito para modernizar o Velho Casarão.
Após voltar à elite do futebol brasileiro, o Grêmio foi visto como uma marca com grande potencial e entrou no radar de diversas empresas que buscavam investir na casa gremista.
Ao voltar da viagem, Eduardo tinha seu plano bem claro em mente, era necessário construir do zero. O plano foi recebido com diversas ressalvas e dúvidas por parte da direção que acreditava que a modernização era o melhor caminho.
Paulo Odone, o presidente gremista na ocasião, concordou com a contratação de uma empresa para fazer um estudo de viabilidade onde foi constatado que haviam mazelas que não permitiam a modernização do Olímpico, tais como a região em que estava localizado, problemas com o padrão FIFA, alto custo de manutenção e o tempo de vida que já era longo. Era chegado o fim da Era Olímpico.
Mas não era missão fácil fazer com que o conselho gremista chegasse em um consenso quanto ao projeto e aceitasse deixar a casa de tantas glórias imortais. Após mais de 50 reuniões do conselho sobre o projeto e alguns empasses entre conselheiros se chegou em uma proposta aceita e com respaldo da empresa que havia feito o estudo de viabilidade e estava envolvida no projeto da nova arena do Ajax que após ser inaugurada fortaleceu a região em que estava e foi um sucesso imenso.
Após o plano ser estruturado e aprovado, chegou o momento de ir atrás de investidores e o vencedor do Consórcio foi o grupo TBZ de Portugal, que acabou desistindo no meio do processo. Foi então que surgiu a Empresa Baiana OAS para abraçar o projeto e tocar a obra. A construção da nova arena se iniciou no ano de 2010 e foram dois longos anos de espera até que a nova casa gremista estivesse de pé e funcional ao seu torcedor.
Pois bem, parecia tudo bem até que o grande elefante branco apareceu na sala do Imortal.
No acordo firmado entre Grêmio e OAS, o terreno em que se situa o Monumental passaria a ser propriedade da OAS como parte do negócio fechado entre as partes. Porém o contrato fechado pelo presidente Paulo Odone começou a ser questionado pelo seu sucessor, o histórico presidente gremista, Fábio Koff.
Ao assumir, Koff foi contundente ao afirmar que o acordo era perverso com o clube e que a Arena não pertencia ao Grêmio, pois foi estabelecido no acordo que o controle da nova casa gremista era da OAS durante o período de 20 anos.
No ano de 2013, ele iniciou a negociação que visava adiantar esse período e encerrar a gestão OAS o quanto antes para que a Arena pudesse enfim ser a casa tricolor sem qualquer aspas ou asterisco.
Um ano após o início das negociações, Koff convocou a imprensa e anunciou que havia chegado a um acordo com a empreiteira, porém, em 2015, Romildo Bolzan assumiu a presidência e viu a OAS ruir com o acordo.
Em declarações, Bolzan, sempre afirmou que as negociações nunca se encerraram e que mesmo quando o negócio estava quase selado, a OAS desistia do acordo de alguma maneira e impedia que fosse formalizado.
Outro grande problema foi o envolvimento da OAS na operação Lava-Jato, que fez com que a empresa fosse à recuperação judicial e hoje ela não existe mais, no papel. Hoje ela se chama Metha, visando se desassociar do escândalo em que era uma das principais envolvidas.
Todo esse imbróglio vivido pela empreiteira dificultou ainda mais a negociação para o clube gaúcho, tendo em vista que a empresa estava envolvida em fraudes que giram na casa do bilhão.
Não apenas o clube, como a prefeitura de Porto Alegre relatou queixas com relação a empresa que se tornou inacessível ao diálogo e torna o processo ao redor do estádio cada vez mais melancólico e dificultoso, tornando o Olímpico em um gigante abandonado ao marasmo.
A despedida
Hoje, o Olímpico é uma dor de cabeça para Grêmio, Prefeitura e comunidade, que não sabem mais o que fazer com o espaço que está em estado lastimável e se tornou casa para moradores de rua, ponto de encontro para usuários de droga e quem desconhece nem imagina as grandes glórias vividas ali.
E a melancolia parece não ter data para um fim, quando visualizamos que hoje o acordo parece mais distante do que quando Fábio Koff deixou a presidência do clube, há quase 10 anos.
O Grêmio já se colocou ao lado da prefeitura e concorda que medidas precisam ser tomadas para o bem da população alocada ali e há um canal de diálogo aberto visando o melhor acordo para que o Olímpico possa enfim ter um fim digno de toda a história que ali foi vivida.
Um dos grandes palcos do futebol brasileiro não merece ter um fim tão triste e amargo como estamos vendo.
O sentimento entre a torcida é de profunda tristeza e mágoa pela forma como tudo foi e é conduzido, chegando a fazer com que alguns torcedores vejam a Arena como um dos maiores erros cometidos na história do clube.
Palco de tantos espetáculos, títulos, conquistas, e que marcou tanta gente em meio a suas arquibancadas de cimento, hoje aguarda um apagar de luzes digno de tudo que representa ao Grêmio e sua gente.