A verdadeira origem do apelido Pó de arroz | Fluminense

Uma das coisas curiosas do futebol é a capacidade da torcida de pegar as gozações dos adversários e transformá-las em trunfos ou até em símbolos do clube.

Victor Luiz Esteves
Por Victor Luiz Esteves 3 Minutos de Leitura

Uma das coisas curiosas do futebol é a capacidade da torcida de pegar as gozações dos adversários e transformá-las em trunfos ou até em símbolos do clube. Foi assim com o Urubu, com o Porco e dizem que ainda acontecerá com o Bambi e o Gambá. Mas o fato é que chamar os tricolores cariocas de Pó de Arroz se deve a um episódio ocorrido em em 13 de maio de 1914, e é um dos mais antigos “batismos” do futebol brasileiro.

Naquele ano, o jogador Carlos Alberto, que era negro, apareceu para jogar com o rosto coberto de branco, e com o suor do esforço em campo, essa cobertura começou a derreter.

A torcida adversária, do América, começou a gritar “Pó de Arroz” e o apelido pegou, pois a própria torcida do Fluminense resolveu adotar o Pó de Arroz como uma tradição e motivo de orgulho. Mais tarde, surgiu a história de que o Pó de Arroz era para disfarçar a cor da pele do jogador, o único negro da equipe. Porém, isso caiu por terra quando se descobriu a verdade, e o Pó de Arroz acabou se tornando um símbolo até mesmo antifascista. Para os adversários de arquibancada, no entanto, chamar a torcida de “Pó de Arroz” era uma brincadeira com outro tipo de discriminação, a homofóbica.

A ideia era que o clube era de “elite”, refinado como o uso de pó de arroz pelas mulheres da época. Mas o fato, puro e simples, é que o jogador apenas tinha o costume de usar o pó de arroz como “pós-barba”, o que parece ser um hábito comum à época.

Torcedores tricolores desmentem a versão de que o jogador tentava se disfarçar de branco, primeiro porque o clube já tinha tido outros jogadores negros, como Alfredo Guimarães, que jogou pelo Flu em 1910 e não usava pó de arroz.

Hoje em dia, quase ninguém mais chama o Fluminense de racista por este motivo, principalmente depois dos muitos ídolos da história tricolor, como Didi, Paulo Cesar Caju, e o inesquecível “Casal 20”, Washington e Assis.

O curioso é que até hoje há quem acredite nisso (que o pó de arroz era uma forma de racismo do Flu para esconder seus jogadores negros), e não é preciso pesquisar muito para encontrar até teses universitárias baseadas nesse engano histórico. Em 2013, a novela “Lado a Lado”reforçou esta crença, retratando a historia do jogador “Chico”, que usava o pó de arroz para esconder sua cor de pele. Nada mais falso e enganador.

Segundo nos conta Mário Filho, jornalista que deu nome ao Maracanã e era irmão de Nelson Rodrigues, o cronista tricolor que marcou época no jornalismo brasileiro, outro jogador que se esforçava para esconder seus traços de negritude era Friedenreich, chamado de “El Tigre”, que dizem ter sido o primeiro “craque” brasileiro e que jogou de 1917 a 1929 no São Paulo. Filho de um alemão com uma negra, “El Tigre” tinha um cabelo duro e dificil de ser alisado, o que fazia com que o jogador tivesse que fazer um ritual antes de entrar em campo, que consistia em untar o cabelo de brilhantina e escová-lo para trás, até que ficasse “liso”.

Dizem que os juízes ameaçavam começar a partida sem o jogador, que acaba atrasando o início da partida porque só entrava em campo quando o cabelo estava devidamente “arrumado”.

A verdade é que o racismo, de fato, existia, e só foi vencido com o tempo, com atitudes inovadoras e principalmente com a evidente proliferação de craques negros, que assim, se tornavam indispensáveis para o espetáculo.

Cabe lembrar aqui do ridículo “Blackface”, que era o ato de artistas brancos, europeus e americanos, pintarem o rosto de preto, normalmente para contarem piadas ou ridicularizarem os negros. Muito comum no século XIX, hoje este costume não é mais aceito, e no caso do Pó de Arroz, para os tricolores, é apenas um instrumento para expressar a alegria de ver a entrada do time em campo.

Jornalista diplomado, Flamenguista e curioso.
Faça um comentário

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *