Presidente mais longevo da história do Barcelona, Josep Núñez divide fortes opiniões na Catalunha até os dias atuais. Tanto pela vida pessoal, quanto profissional no clube, o idealizador do “Nuñismo” Blaugrana é uma das personalidades mais interessantes da história deste clube, que hoje o Noite de Copa vai contar para você.
Quem é Josep?
Nascido em Barakaldo, no País Basco, Josep Lluís Núñez (1931 – 2018) e durante 1978 até 2000 fez longos 22 anos à frente da presidência do Barcelona, tornando-se o presidente com maior longevidade na história do clube. Ele foi responsável diretamente por 176 troféus, um recorde do clube, sendo eles 30 no futebol, 36 no basquete, 65 no handebol e mais 45 no hóquei no gelo – as quatro maiores frentes olímpicas adotadas por Josep no clube. Além disso ele foi o mentor da criação de La Masia após comprar o terreno da Ciutat Esportiva Joan Gamper, a base do Barcelona que formaria jogadores lendários futuramente como Lionel Messi, Xavi Hernández e Andrés Iniesta, por exemplo. Fora, aumentou a capacidade do Camp Nou de 77 mil para 106 mil lugares em sua gestão e inaugurou o museu do Barcelona, hoje um ponto turístico catalão e uma das principais receitas anuais do clube.
Durante sua era na presidência do Barcelona, ele também ficaria marcado por trazer nomes ao clube como Diego Maradona, Rivaldo, Ronaldo, fez sua equipe de basquete se tornar uma das referências na Europa e foi quem trouxe Johan Cruyff para ser o treinador do time, no que para muitos foi a maior revolução da história futebolística, com o “Cruyffismo” no Barça.
Contradições
Josep nunca foi bem aceito na Catalunha por dois motivos. O 1º deles é o fato dele não ser nascido na região Catalã, uma região separatista da Espanha, que tem forte apelo para personalidades locais e uma resistência maior para quem vem de outros lugares da Espanha. Nascido no País Basco, ele sofria forte rejeição dos meios de comunicações e principalmente da burguesia local. O 2º motivo é o fato dele ser o proprietário da construtora Núñez i Navarro, junto de sua esposa Maria Lluisa Navarro.
Como a Catalunha no século XIX foi reindustrializada pelo ramo têxtil, as fábricas locais eram a grande fonte de renda e sustento da maior parte da população catalã. Josep vinha de fora, sem nenhum vínculo com o Barcelona e por trás, era responsável pela construtora que executaria diversas obras pela cidade, onde para muitos, implicaria com o comércio têxtil catalão. Em rota de colisão com a mídia, seu nome era constantemente sonorizado na linguagem catalã e não basca na imprensa regional.
Ele também adquiriu forte rejeição por grande parte da torcida do Barcelona por ter demitido Johan Cruyff do cargo técnico do time. Fora perder jogadores como Luís Figo para o Real Madrid, de forma direta, permitindo a ascensão de Florentino Pérez na capital espanhola. Considerado uma figura de personalidade forte, ele chegou a demitir 14 jogadores em 1988 e mais o técnico (no episódio que o fez buscar Cruyff) e também o mesmo se desentendeu com o ídolo holandês que posteriormente não pouparia palavras para criticar Josep em público.
Legado
Ao assumir o clube no final dos anos 70, Josep conseguiu salvar o Barcelona da irrelevância. Com um saldo negativo de receitas, ele deixou o clube em 2000, ao renunciar seu cargo sob forte pressão, mas com 72M em patrimônios. Vindo de fora da Catalunha, Josep teve um início conturbado no clube, pois mesmo após vencer Jordi Pujol na corrida presidencial, ele era constantemente atacado pela oposição por sua origem fora da Catalunha. Em contrapartida, Núñez já era visto em público falando catalão desde os anos 60.
A ideia de Núñez era de seguir o que Augustí Montal fez: dar prosseguimento à expansão do Camp Nou e fincar o legado “Més que un club” idealizado por ele. Núñez era considerado um empresário que via lucro acima de tudo, onde sua construtora desrespeitava comerciantes e empresários locais, e sua forma de ganhar dinheiro não era a mais bem vista na cidade.
Crise no elenco
Em 1988, um ano antes da eleição no clube, ao menos 14 jogadores e o treinador Luis Aragonés foram demitidos por Josep Núñez no hotel Hesperia Tres Torres. O motivo era o fato deles liderarem um movimento pela candidatura de Pujol, velho rival de Josep, além de exigirem mudanças fiscais envolvendo salários dos jogadores. Sem titubear, Josep desligou todos atletas e o técnico, evitando aumentar a crise interna que fortaleceria Pujol. Curiosamente ele venceria aquela eleição mais uma vez, em 1989.
Aquele episódio deu origem ao início de Johan Cruyff no cargo técnico do Barcelona. (1988 – 1996), onde para muitos foram os anos mais brilhantes do clube, onde o holandês implementou à filosofia da Laranja Mecânica ao Barça. Neste período, o time do Barcelona passaria a ter maior apreço pelo domínio da bola, prezando pela técnica e a qualidade do jogo bonito, onde esses métodos os levariam para as vitórias.
Contudo, trazer Cruyff não foi fácil para Josep. Por ser um presidente que gostava do protagonismo, ele não aprovava o estilo confrontador de Cruyff, que o questionava a cada decisão sobre o time, além de não se poupar em criticá-lo quando necessário à mídia. Cruyff também foi o responsável pelo fim do “Nuñismo”, criando assim o “Cruyffismo” – pois a partir dali Josep já não era mais o grande nome do clube, mas sim ele.
Para muitos, a Copa del Rey vencida pelo Barcelona sobre o Real Madrid em 1990 foi a maior conquista de copas nacionais da história do clube. Ali se viu o ressurgimento do Barcelona, onde ganharia ainda mais força com as Olimpíadas de 1992 na cidade e o Dream Team formado por Cruyff, com Romário, Pep Guardiola, Stoichkov, Laudrup, Koeman e cia. Eles foram campeões da Champions League (1991-92), tetracampeões de La Liga (1990-1994), entre outras conquistas como a citada Copa del Rey.
Clube para as lendas
Clube que até então jamais havia ganhado uma Champions League, foi na gestão de Josep que o Barcelona passou a ser mais protagonista, ao invés de só o Real Madrid. Com Cruyff técnico, eles ganharam sua primeira UCL em 91-92. Ainda nos anos 90 passariam por lá, nomes como Romário, Ronaldo Fenômeno, Rivaldo, além de inúmeros holandeses como os irmãos De Boer, Koeman, Kluivert e cia. Outras lendas europeias também chegariam, como o português Luís Figo, o búlgaro Stoichkov, o dinamarquês Michael Laudrup, entre outros. Fora a formação de jogadores com La Masia funcionando a todo vapor. Pep Guardiola, Zubizarreta, etc.
Seu fim
Da mesma medida em que trazia craques, Josep era conhecido por perder suas estrelas de forma questionável. Por exemplo, após ser campeão do mundo em 1994, Romário até então melhor jogador do planeta, trocou o Barcelona pelo Flamengo. Ronaldo Fenômeno, após ganhar notoriedade mundial no Barcelona, saiu para ser o melhor jogador do mundo em 1997 na Internazionale. Luís Figo, principal estrela do time no final dos anos 90, sairia diretamente para o Real Madrid em 2000, algo imperdoável para os catalães. Pressionado, após 22 anos na presidência, Josep renunciou seu cargo um mês antes das eleições, em abril de 2000.
Prisão e morte
Considerado culpado no caso “Hacienda”, onde durante 1991-1999 ele e seu filho Jose Lluis, foram condenados à 6 anos de prisão e multa em 2M de euros por suborno e corrupção. Eles teriam falsificado documentos para fraudar resultados financeiros e além de tudo, subornar funcionários públicos para não investigá-lo. O caso só teve fim em 2011, com sua sentença, mas ele só foi preso em 2014. Pouco depois, sua pena foi redirecionada para o crime de suborno, onde a pena caiu para 2 anos e multa em 1,5 milhão de euros, além da proibição por 7 anos de mandato público.
Sua morte ocorreu em 2018, após uma longa batalha contra o câncer. Ele havia retomado o controle da sua construtora após sair da prisão e desde a renúncia em 2000, não participava mais da vida política do Barcelona.